Tânia Regina Zimmermann
Ana Carolina Oliveira Carlos
FACES DA HISTÓRIA, Assis-SP, v.1, nº1, p. 71-88, jan.-jun., 2014.
conceitos, são mais funestos. Os tais negam Deus claramente, e
perseguem sua Igreja; em Religião são ateus, em moral sensualista. [...]
Não se sabe dizer deles si corrompem os costumes para extraviarem as
inteligências, ou si pelo contrario, pervertem as inteligências para
corromperem os costumes: tal é a mistura que há neles de erros e
imoralidades. Os jornais dessa espécie não são simpáticos para ninguém
por desalmado que seja; sua deformidade os faz repugnantes até para os
mais perversos. Os que com tais armas combatem a religião e a moral
mostram ser moços inexpertos ou velhos egos pelo furor até ao ponto de
desconhecerem o ABC da estratégia. Não escrevem para discutir, nem
para uma leitura sossegada, senão para produzirem uma pressão de
momento, ou lançar abilis longo tempo contida e comprimida.[sic] Rasgai,
filhos do povo, a página ímpia do jornal ou revista, que voz diz o que nunca
queirais ouvir dos vossos filhos e mulher. Rasgai essa folha que vos
apregoa o ódio como o único sentimento digno de vosso coração. [...] (A
CRUZ, 15 de janeiro de 1910, p. 3)
As moças que usufruíam de leituras inapropriadas para uma respeitosa jovem cristã
eram tidas como tentadas pelo diabo e assemelhadas a narrativa bíblica de Eva no Paraíso.
Assim, percebe-se que a mulher católica deveria abdicar de certas leituras que poderiam
influenciá-la com pensamentos maldosos adormecidos e, assim, desvirtuar-se de sua
“natureza” cristã.
O periódico perpassava, além disso, a imagem de que cabia à mulher católica a
responsabilidade obrigatória de zelar, rigorosamente, pela religião de sua família. Maria José
Rosado Nunes, em seu ensaio intitulado Gênero e Religião, salienta que “(...) o investimento
da população feminina nas religiões dá-se no campo da prática religiosa, nos rituais, na
transmissão, como guardiãs da memória do grupo religioso.” (NUNES, 2005, p. 363). Ou
seja, as mulheres católicas, do início do século XX, conforme se viu nas matérias do
impresso A Cruz, deveriam ser encarregadas da realização das práticas religiosas, com
extrema devoção e piedade, no interior do seu grupo familiar, sendo este um preceito
religioso determinado pela Igreja. Destarte, segundo Maria José Rosado Nunes:
As religiões têm, explícita ou implicitamente, em seu bojo teológico, em sua
prática institucional e histórica, uma específica visão antropológica que
estabelece e delimita os papéis masculinos e femininos. O fundamento
dessa visão encontra-se em uma ordem não humana, não histórica, e,
portanto imutável e indiscutível, por tomar a forma de dogmas. Expressões
das sociedades nas quais nasceram, as religiões espelham sua ordem de
valores, que reproduzem em seu discurso, sob o manto da revelação divina.
O lugar das mulheres no discurso e na prática religiosa não foi, e
frequentemente ainda não é, dos mais felizes. (NUNES, 2005, 363-4)
No contexto específico do catolicismo, a autora Zaíra Ary, ao falar do lugar social e
do valor simbólico das mulheres dentro da Igreja Católica, afirma que:
[...] de certa forma, as mulheres estão excluídas dos lugares de poder e
são, portanto, aí desvalorizadas como pessoas; por outro lado, elas
constituem o público mais fiel, mais assíduo e, portanto, numericamente