CORRÊA, Silbene
FACES DA HISTÓRIA, Assis-SP, v.3, nº2, p. 57-74, jul.-dez., 2016.
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Conhecida como uma comunidade de “pretos”
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, a cidade está situada no vale do
Guaporé, rio caudaloso, que durante o período de cheia ainda inunda a cidade como
nos tempos coloniais. Pequena em extensão, mas rica em cultura e história, Vila Bela
é um atrativo turístico histórico e de aventura que atrai mais pessoas a cada ano, para
assistir principalmente a festança em honra ao Divino, Nossa Senhora e São Benedito
sempre em julho de cada ano. Fundada por brancos portugueses, foi abandonada no
primeiro quartel do século XIX devido a transferência administrativa para Cuiabá, e
por isso, passou por períodos difíceis, mas ressurgiu e foi reinaugurada pelos negros
que ali permaneceram, onde recriaram a si mesmos, para si próprios, refazendo e
transformando suas práticas culturais num cenário de ruínas e desolação que Vila Bela
se tornou (BANDEIRA, 1988, p. 22-25).
A surpresa foi encontrar uma cidade movimentada com uma comunidade
formada por vários tipos de sujeitos sociais, práticas religiosas variadas, numa mistura
étnica sem a predominância dos negros, como é divulgada pela mídia, e conversando
com os habitantes foram enfáticos em afirmar que agora eles são a minoria, até mesmos
durantes as festanças, mas os poucos que restam, ainda resistem às transformações do
mundo moderno.
Vila Bela primeiramente originou-se do Distrito da Paz, passando a ser munícipio
ligado ao que hoje chamamos de Estado de Mato Grosso em 1743, e sua emancipação
política deu-se em 1752, com a fundação da vila. Em 1818 recebeu o Alvará de foros de
cidade, mudando seu nome para Mato Grosso, denominação que perdurou até 1978,
quando lhe foi devolvido o antigo nome Vila Bela da Santíssima Trindade. Pelo conjunto
hidrográfico que a cerca, é divisora das águas da Bacia Amazônia e Platina, com relevo
acentuado onde destacamos a Chapada dos Parecis, as Serras da Borda, de São Vicente
e de Ricardo Franco (BANDEIRA, 1988, p. 35-44).
Em 1752 foi registrado pelo fundador e primeiro presidente da Província de Mato
Grosso, Dom Antônio Rolim de Moura, que a população era de 2.227 almas, sendo que
desses, 1.175 eram escravos, 1.052 eram livres (mulatos, bastardos, pretos forro, índio e
brancos) e somente 70 eram brancos. Luiz de d’Albuquerque de Mello Pereira e Cáceres
registrou que a população de Vila Bela e seus arraiais em 1780, era de 5.199, no Forte
Príncipe de Beira e missões próximas era 795, num total de 5.994 habitantes, formados
por negros, mulatos, outros mestiços “das muitas diferentes espécies” sendo a maioria
os escravos africanos. O Censo de 1800 mostrou que a população era de 504 brancos,
131 índios, 5.163 negros, 1.307 mulatos (BANDEIRA, 1988, p. 45-63).
Os dados de 1821 apontam que a população de Mato Grosso (Vila Bela) e seus
distritos era de 5.819 habitantes, registrado pelo Conselheiro Herculano Ferreira Penna.
Outro levantamento realizado por Luiz D’Alincourt, por volta de 1828, informou que
a população de Vila Bela era de 1.595 almas, diminuindo consideravelmente devido
à mudança da capital para Cuiabá, sendo os livres 1.093 e 502 escravos. Em 1849, o
Presidente da Província e Mato Grosso elaborou um mapa da população, registrando
que em Vila Bela tinha 2.760, dos quais eram livres 2.230 e 530 escravos e incluía
Casalvascos, São Vicente e outras localidades. Vários foram os fatores para a redução
2. Pretos não significa nenhum adjetivo pejorativo, significa mais um marco divisor entre ser branco e
ser preto, utilizado pelos habitantes de Vila Bela. Não entraremos nesta discussão sobre a utilização dos
termos negros, pretos, africanos neste artigo, pois o objetivo é analisar as influências dos africanos na
formação cultural cuiabana.