Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 39-60, jul./dez., 2023
Naquele momento, é possível perceber que a hegemonia das ruas estava nas mãos
das diversas formas de conservadorismo. Mesmo movimentos de viés progressista foram
marginalizados. Em meio ao desdobramento da Operação Lava Jato, os grupos formaram
suas pautas, que podemos resumir da seguinte forma:
Pauta da corrupção: historicamente, a corrupção sempre foi entendida pelo senso
comum como uma espécie de “mal de origem” do Brasil e atingia todos os partidos e
políticos de maneira indistinta, levando ao ápice do slogan “rouba, mas faz”. A operação
midiática da Lava Jato conseguiu dar combustível para uma espécie de reorganização do
raciocínio. A corrupção não era mais um problema geral, mas concentrado num único
partido, o Partido dos Trabalhadores, e em seus políticos, entre eles, Dilma, José Dirceu, José
Genoíno, mas, principalmente, Lula.
A consolidação dessa pauta, como demonstram Rocha (2021) e Nunes (2022), foi
modelada com a ajuda da “filosofia” e de toda a sorte de teorias da conspiração de Olavo de
Carvalho. Os esquemas de corrupção seriam, na verdade, parte de um plano maquiavélico
da esquerda que, por meio da atuação de “institutos”, como o Foro de São Paulo, buscavam
corromper as instituições que ainda funcionavam (outras, como as universidades, na lógica
olavista, já haviam sido tomadas pela esquerda), a partir de uma tática de atuação, o
combate ao aquecimento global, que seria, no fim, o caminho para o comunismo.
As teorias que se formaram com base no senso comum e a partir de premissas nada
racionais alimentaram um segundo ingrediente poderoso de mobilização. Assistimos ao
ressurgimento do conservadorismo, de viés bastante obscurantista. Nesse sentido, o
combate passou a ser contra todo e qualquer direito que as minorias haviam conseguido
desde a Constituição de 1988. Não à toa, manifestavam um desprezo pelas leis de cotas e
contra o feminicídio e, principalmente, pelos programas de transferência de renda, como o
Bolsa Família, pois tal ascensão político-econômica representava a maneira dessas
populações resistirem de maneira mais efetiva à condição de humilhação histórica que
haviam sofrido.
A partir de 2015 o MBL ganhou o protagonismo das ruas e, rapidamente, mudou suas
perspectivas ideológicas. Do liberalismo de 2013, desembarcou no conservadorismo
esdrúxulo da militância contra a “ideologia de gênero”, contra a legislação que protege as
minorias, como a lei do feminicídio, e passou a dividir espaço com lideranças, como
Alexandre Frota, e figuras de duvidosa capacidade política, como Jair Bolsonaro.