Faces da História, Assis/SP, v. 10, n. 2, p. 252-279, jul./dez., 2023
A imagem 4, extraída da edição 22, é um cartum que representa a visualidade do
homossexual pintoso. Além de deixar ressaltado os atributos femininos que marcavam o
corpo de um homossexual pintoso (como as pulseiras, o salto alto, as vestimentas) o
desenho exibe uma cesta sobre a cabeça da personagem carregada de falos. A imagem
reforça as elaborações criadas pelo editor de que essa identidade não aceitava sua
“orientação sexual com naturalidade” e que, portanto, não se enquadrava facilmente na
sociedade. Além disso, a cesta cheia de membros e os olhos da figura fixados em sua direção
indicam que os homossexuais pintosos não conseguem esconder seus desejos, tendo, assim,
estampado em sua cabeça suas vontades sexuais. Se o pintoso agredia por ter interiorizado
os valores machistas e, com isso, passava a agir de modo não natural, ou seja, de forma mais
feminina que um homossexual entendido, a bicha-louca era produzida por determinados
editores como uma identidade que estava em desvairo.
Para o jornal a bicha-louca era, muitas vezes, bicha por ser feminina e louca por ser
pouca esclarecida e desinformada a respeito de sua identidade homossexual (Bandeira,
2006, p. 103-104). O artigo intitulado louca e muito da baratinada, publicado na edição oito,
de 1979, e escrito por Hector e Ricardo da Frente de Libertação Argentina no Exílio expôs
que a bicha-louca tem comportamentos “exagerados” pois internalizou a opressão do
patriarcado. De acordo com os autores, a bicha-louca está na beira da insanidade e, ao
descartar “a possibilidade de penetrar genitalmente em seu companheiro” ocultando seu
órgão genital, ela produz uma dicotomia angustiante inserindo sua relação sexual “no campo
da heterossexualidade, como uma caricatura. A louca, negando seu corpo, e obrigando seu
companheiro a um determinado papel, permanecerá prisioneira do esquema machista”
(Lampião da Esquina, 1979, p. 1979) e estará muito perto de se tornar uma travesti ou, no
extremo de seu devaneio, uma bicha biônica.
As representações e visualidades construídas pelo Lampião da Esquina acerca das
identidades travestis foram marcadas por muitas contradições. Assim como o termo
homossexual – que funcionou como um grande guarda-chuva que abrigava identidades
travestis, gays e lésbicas –, a palavra travesti foi utilizada para apresentar uma multiplicidade
de experiências: “uma mais próxima do ‘ser’ travesti, com o corpo modificado [...]; e um
‘fazer’ travesti na montação [...]. Poder-se-ia ser travesti, mas também fazer travesti, ainda
que todas fossem, nos discursos correntes na época, homossexuais em uma escala de
feminilidade” (Canabarro; Meyrer, 2015, p. 21-22). Existia uma dicotomia que marcou as