Aqui jaz Arthur: literatura arturiana no medievo e seu reflorescimento na idade contemporânea
FACES DA HISTÓRIA, Assis-SP, v.2, nº2, p.42-60, jun.-dez., 2015.
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sua cientificidade, onde o grande público não está em contato com as pesquisas
científicas sobre um tema, de certa forma, de conhecimento universal.
Outra adaptação que Bradley fez para sua obra foi a fusão entre os personagens
Taliesin e Merlin. Em seus livros, Merlin é o nome de um cargo sagrado entre os druidas
britânicos, um espírito que reencarna quando há necessidade de sua ajuda, e Taliesin é
o nome do humano onde ele reencarnou, um bardo druida.
Também pode-se observar a opção que Bradley fez pela divisão de certos
personagens, que às vezes eram confundidos com o mesmo: um destes casos é Viviane
e Nimue, em alguns contos os nomes são usados conforme a vontade do autor, porém,
em Bradley, vê-se os dois nomes usados para a Dama do Lago serem divididos em dois
personagens diferentes. Viviane é a Senhora do Lago, irmã de Igraine (esta analogia foi
inventada pela autora), tia de Arthur e de Morgana, mãe de Lancelot. A outra, Nimue,
neta de Viviane, filha de Lancelot, é quem seduz e aprisiona o Merlin.
Outro caso é Morgana e Morgause. Em alguns casos estes dois nomes se
referem à mesma personagem, a meia-irmã de Arthur. Bradley faz destes nomes duas
personagens distintas. Morgana é meia-irmã de Arthur, filha de Igraine e seu primeiro
marido, Gorlois, mãe de Mordred, paixão secreta de seu irmão, sacerdotisa de Avalon.
Morgause é tia de Morgana e de Arthur, irmã de Viviane e de Igraine, casada com Lot de
Orkney, mãe de Gawaine, Gaheris, Gareth e Agravaine, mãe adotiva de Mordred.
As Brumas é uma obra muito intrincada, pois aborda as pequenas lendas que
compõem a lenda arturiana de uma forma muito criativa, como já disse acima. Por
exemplo, normalmente Mordred é posto como irmão de Gawaine, Gaheris, Gareth e
Agravaine, todos eles são filhos de Morgana (ou Morgause) e é assim que começa a
guerra civil do final do reinado de Arthur, Mordred, com apoio de seus irmãos, toma
Guinevere como esposa e se coroa rei. Bradley opta por fazê-los irmãos de criação,
não todos filhos biológicos de Morgana, já que para a história ela era uma sacerdotisa
e, portanto, não casada.
Outro motivo para que Morgana não se casasse era inédito e foi introduzido por
Bradley com grande brilhantismo. Ela readaptou o amor infiel de Lancelot por Guinevere
em um contexto digno do séc. XX. Que Lancelot era apaixonado pela rainha não era
novidade, contanto, Arthur amar Morgana era novidade, apesar do filho que tiveram
juntos. E ainda Morgana amar Lancelot era um grande complicador de toda a trama.
Grandes complicações decorrem em todos os livros por causa destes amores
proibidos: em uma cena, Guinevere está desesperada por causa de sua infertilidade,
ela pede para Morgana lhe dar um amuleto para conseguir gerar um herdeiro para o
rei, Morgana a aconselha a cuidar o que deseja quando lhe dá o amuleto. No final, o que
ocorre é Guinevere indo para a cama junto com Arthur e Lancelot. A partir disso acaba
todo amor que uma sentia pela outra.
É muito bem planejado o contexto dos sentimentos religiosos que se exprimem
através das personagens, como a consciência de Guinevere que se configura como um
dos pontos mais interessantes da obra, a culpa, legado católico para a cultura ocidental,
se exprime através das ações e arrependimentos da rainha, que ama perdidamente
Lancelot, mas se culpa pela sua infidelidade e credita a isto sua infertilidade.
O primeiro Merlin (chamado de Taliesin, como explicado antes) não vive durante