FRANÇA, Aline de Souza Araújo *
https:// orcid.org/0000-0003-3790-8971
RESUMO: O objetivo deste artigo é realizar
uma análise da obra
Guia da Mulher pejada
,
escrita pelo médico José Ricardo Pires de
Almeida (1843-1913). Foi publicada inicialmente
na imprensa em 1881 e em formato de livro no
ano de 1884. Esta obra era direcionada para as
mulheres pejadas, ou seja, em estado de
gravidez e possuía o intuito de oferecer
informações médicas para que pudessem
manter a gestação de forma saudável. Sendo
assim, a partir do conceito de vulgarização
científica, foram selecionados para a análise
alguns trechos da obra, na qual se refletirá
sobre as relações entre ciência, medicina e
mulheres no Brasil do século XIX.
PALAVRAS-CHAVE: vulgarização; medicina;
mulheres; imprensa.
ABSTRACT: The aim of this article is to
analyze the work Guia da Mulher pejada,
written by physician José Ricardo Pires de
Almeida (1843-1913). It was first published in
the press in 1881 and in book format in 1884.
This work was aimed at expectant women, that
is, in a state of pregnancy and had the
intention of offering medical information so
that they could maintain the pregnancy in a
healthy way. Thus, based on the concept of
scientific vulgarization, some excerpts from
the work were selected for analysis, in which
the relationship between science, medicine
and women in nineteenth-century Brazil will
be reflected.
KEYWORDS: vulgarization; medicine; women;
press.
.
Recebido em: 21/07/2021
Aprovado em: 08/10/2021
* Mestre em História pela Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz. Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em
História das Ciências e da Saúde, Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz. Bolsista Capes. E-mail:
aline.souza.araujo@outlook.com Esse artigo é parte do capítulo dois da minha dissertação de mestrado,
intitulada de “Um livro “maneiro, singelo e despido de pretenções scientificas”: o
Guia da mulher pejada
e a
vulgarização científica no século XIX”. 2020. 160 f. Dissertação (Mestrado em História). Rio de Janeiro:
Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde/COC/Fiocruz, 2020.
Este é um artigo de acesso livre distribuído sob licença dos termos da Creative Commons Attribution License.
Introdução
Este trabalho se propõe a analisar a obra
Guia da mulher pejada
, do médico e
literato José Ricardo Pires de Almeida (1843-1913), procurando compreendê-la como uma
obra de vulgarização das ciências. Publicada inicialmente nas colunas do periódico
A i
de Familia
, no Rio de Janeiro,
entre os anos de 1881 a 1883, essa obra foi editada em
formato de livro pela Typographia Lombaerts, em 1884, com uma segunda edição em
1895.
Pires de Almeida doutorou-se em medicina na Faculdade de Medicina do Rio de
Janeiro no ano de 1871, com a tese, “Parallelo entre as escolas hystologicas, franceza e
allemã; Secção accessoria, Applicação da electricidade á therapeutica; Secção medica,
Medicação anesthesica; Secção cirurgica, Do apparelho da visão”. Atuou como chefe do
Arquivo da Secretaria da Câmara Municipal, foi delegado e comissário vacinador da Junta
Central de Higiene Pública e foi médico adjunto da Santa Casa da Misericórdia do Rio de
Janeiro. Escreveu diversas peças de teatro, obras na área da medicina, teve extensa
colaboração nos jornais
A Mãi de Familia
e
A Estação
. Foi gerente do periódico
Archivos
de Medicina, Cirurgia e Pharmacia no Brazil,
colaborador de diversos periódicos, tendo
sido redator no
Brazil Illustrado. Archivo de conhecimentos uteis
, juntamente com Felix
Ferreira (1841-1898).
José Ricardo Pires de Almeida foi um dos autores que, no século XIX, publicaram
obras dos mais diversos gêneros literários. Sua produção foi muito extensa, abrangendo
formas como livros, partituras, poesias, peças de teatro, artigos científicos, artigos sobre
história do Brasil, e folhetins.
Alguns aspectos da vida cotidiana de Pires de Almeida foram noticiados nos
jornais do Rio de Janeiro, o que pode ser um indicativo de suas relações sociais e de seu
status na sociedade carioca oitocentista. Um exemplo disso foi a notícia sobre o seu
casamento com Ernestina da Silva Lima, publicada na
Gazeta da Tarde
(1883, p. 3) e em
A
Folha Nova
(1883, p. 1).
Outros eventos, como o aniversário de sua esposa, foram divulgados no
Diário de
Notícias
(1887, p. 1) e na
Gazeta da Tarde
(1888, p. 2). A simples presença do médico na
Rua do Ouvidor também era motivo para ser registrado em jornal (
Diário de Notícias
,
1888, p. 2).
Seu ingresso como membro do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro foi
igualmente noticiado. O médico apresentou, para seu ingresso na instituição, uma
memória justificativa dos costumes dos Países Baixos (
Gazeta da Tarde
, 1886, p. 2).
Esses aspectos da vida de Pires de Almeida, noticiados em jornais de grande
circulação, podem indicar seu reconhecimento social e profissional na época. Pires de
Almeida foi autor de vários artigos, publicados em diferentes periódicos, de vários livros
e, também, exerceu profissão como médico, atendendo inclusive em consultório. Suas
atividades como clínico eram sempre publicadas nos jornais, bem como o endereço de
seu consultório, e muitos os anúncios de suas obras.
Neste estudo procuraremos analisar o
Guia da mulher pejada
a partir de uma
perspectiva que busque refletir sobre a vulgarização das ciências. A escolha por essa
chave de análise se deu para que se buscasse compreender que conteúdos científicos
estavam sendo produzidos para as mulheres do período.
O conceito de vulgarização científica
A vulgarização científica teve sua gênese na França do século XIX, foi um
movimento no qual diversos homens de letras se incumbiram da ‘missão’ de levarem as
luzes para esclarecer o povo (BENSAUDE-VINCENT, 2010). Compreendia-se que apenas
pela educação e instrução poderia se verificar o progresso de uma nação e o
melhoramento da sociedade. A partir disso, em finais do século XVIII e ao longo do XIX,
foram publicadas obras e periódicos com o intuito de difundir o conhecimento para um
público amplo, um público não especialista.
Muitas das obras de vulgarização apresentavam a característica de um manual. O
autor, geralmente um especialista, traduzia os conhecimentos produzidos, por
estudiosos em diversas instituições, por meio de uma linguagem acessível, de forma que
pudesse ser compreendida pelo blico não especialista. (VERGARA, 2003). Esses
conteúdos, que passavam por esse processo de tradução, eram, em sua maioria,
selecionados tendo em vista sua potencialidade de aplicação no cotidiano das
populações. Por isso, a questão da utilidade foi uma forte característica da vulgarização.
A historiadora Bernadette Bensaude-Vicent (2010) realizou um estudo sobre o
auge e a decadência do uso da expressão “vulgarização científica”. De acordo com a
autora, o termo foi usado desde o século XIX, na língua francesa, para designar toda
atividade de comunicação da ciência com o grande público. Entre estas, estavam livros,
revistas, exposições. Para a autora, a iniciativa que os vulgarizadores tinham em tentar
fazer com que a ciência pudesse alcançar o grande público, poderia ocorrer através
da adaptação da linguagem. Por isso, ela reitera que os vulgarizadores eram as figuras
responsáveis por realizar uma ponte entre o mundo científico e o grande público.
A publicação do
Guia da mulher pejada
está inserida em um contexto no qual se
deu uma expressiva diversidade de produção de livros e periódicos sobre vários temas
médicos e científicos, sendo direcionados para um público leigo. Essas publicações, eram
elaboradas com o intuito de instruir os leitores nos preceitos científicos e tornar o
conhecimento aplicável no cotidiano das pessoas.
Portanto, partindo da premissa de que o
Guia da mulher pejada
foi escrito com o
intuito de tornar o conhecimento médico acessível a um público específico, que no caso
eram as mulheres, procuraremos realizar a análise da obra. Escrita para as mulheres que
estivessem em período de gestação, o
Guia da mulher pejada
tinha como principal
objetivo instruir a mulher sobre os preceitos higiênicos que deveriam ser observados ao
longo do período gestacional, e apresentar as moléstias que poderiam se manifestar por
ocasião da gravidez e os meios de combatê-las, como as receitas de medicamentos que
foram incluídas na obra.
O Guia da Mulher Pejada no jornal
A
Mãi de Família
O jornal
A Mãi de Familia
publicou a
Hygiene da mulher pejada
, obra escrita e
publicada pelo médico José Ricardo Pires de Almeida, ao longo dos anos de 1881 a 1883.
Nesta, Pires de Almeida apresentou maneiras pelas quais a mulher grávida deveria
proceder para manter a sua saúde e, desta maneira, a de seu filho.
A obra foi publicada no jornal em formato de fascículos, com o título das seções
de
Hygiene da mulher pejada
. Os assuntos eram referentes às atitudes que a mulher
grávida deveria ter para manter sua saúde e, assim, evitar moléstias.
As discussões médicas da época acerca da mortalidade infantil procuraram
alcançar as famílias e apresentar, através de diversos meios, como os livros e os
periódicos, que parte da responsabilidade pelo alto número de crianças que chegavam a
óbito, antes dos dois anos de idade, era por conta de hábitos considerados nocivos à
saúde da criança. Com o intuito de modificar este cenário, a medicina da época construiu
um discurso no qual afirmava que cabia aos pais e principalmente, à mãe, zelar e cuidar
dos filhos com base em conhecimentos científicos.
Portanto, neste contexto, foram diversos os manuais publicados com linguagem e
conhecimento adaptados às mães, nos quais estas eram aconselhadas, sobre como
deveriam agir com relação à alimentação, vestimenta, ambiente, banhos, passeios,
brinquedos dos filhos.
A obra de Pires de Almeida pode ser compreendida como um manual que se
propunha a estes objetivos. Apesar de o foco de Pires de Almeida ter sido na saúde da
mulher pejada, pode-se afirmar que sua preocupação maior era com a criança. As
discussões que se afirmaram no período, com base na construção da nação e da
nacionalidade, privilegiavam o nascimento de cidadãos fortes e sadios, considerados
como os futuros responsáveis pelo país. Por isso, compreende-se a motivação de uma
geração, da qual Pires de Almeida fazia parte, em propor reflexões a respeito da ciência
em suas relações com a construção da nação.
Manuais de medicina popular no século XIX
Lycurgo de Castro Santos Filho, autor de
História geral da medicina brasileira,
identificou um conjunto de obras de medicina para uso popular, que circularam no Brasil
ao longo do século XIX. Ao todo, segundo o autor, 35 manuais circularam no Brasil
durante o século, além de periódicos que possuíam seções nas quais publicavam
orientações sobre saúde e doença para o uso do povo (SANTOS FILHO, 1991).
Esses manuais eram, na maior parte das vezes, escritos por médicos, cuja
formação havia sido realizada, em sua maioria, nas faculdades de medicina do Império.
Essas obras exerciam a função de vulgarizar, popularizar os conhecimentos médicos
sistematizados nas academias. De acordo com Betânia Figueiredo, em diferentes partes
do Império, o conhecimento adquirido através da leitura e estudo destes manuais,
tornava o indivíduo capacitado para atuar em questões de saúde e doença na ausência do
médico. (FIGUEIREDO, 2005).
Assim como Figueiredo, Cotrim Guimarães (2005) demonstra a importância
destes manuais para um público que não tinha acesso à figura do médico, embora não se
deva supervalorizar a atuação médica deste período, tendo em vista o pouco número de
médicos em detrimento do tamanho do Império.
1
Era pelo caráter “acadêmico, pedagógico, civilizador e higienista” dos manuais
que muitas pessoas do interior recorriam aos primeiros socorros e à formulação de
remédios (GUIMARÃES, 2008, p. 827). A ideia da ajuda nos primeiros socorros e a
formulação de medicamentos era recorrente nos manuais. Em sua maioria, se divulgava
o conhecimento de forma mais amena, mais resumida, de modo que pudesse ser lido
pelos práticos, por indivíduos que não tinham formação acadêmica, mas que praticavam
a medicina. Eram os curandeiros, as parteiras, os benzedeiros, os boticários, os raizeiros,
oriundos de camadas pobres da população. A dinâmica de atendimento dos médicos
passava pela relação de confiança que estes construíam com seus pacientes. Isso quer
dizer que, boa parte da população brasileira, principalmente as de classes mais baixas,
1
. Como bem aponta Betânia Figueiredo (2005) embora a medicina deste período já estivesse criando
mecanismos que restringiam as artes de curar que somente poderiam ser exercidas por aqueles que
possuíssem formação na área médica, diversas regiões do Império estavam acostumadas a lidar com a
inexistência deste profissional e com a atuação de diversos indivíduos, como os curandeiros, as parteiras,
os boticários, os raizeiros. Dessa forma, a dinâmica de atendimento dos médicos passava pela relação de
confiança que estes construíam com seus pacientes. Isso quer dizer que, boa parte da população brasileira,
principalmente as de classes mais baixas, optava por recorrer a outros profissionais das artes de curar,
pois estes, em muitos casos, faziam parte de seu convívio social.
optava por recorrer a outros profissionais da arte de curar, pois estes, em muitos casos,
faziam parte de seu convívio social.
Os manuais também podem ser interpretados como um mecanismo de inserção
dos saberes médicos oficiais no cotidiano daqueles que os estudavam e os liam. Como
eram obras escritas por médicos que estavam ligados, de alguma maneira, às instituições
médicas do período, como as faculdades de medicina e a Academia Imperial, esses
médicos procuraram adaptar à linguagem leiga os conhecimentos que eram ali
produzidos. Sendo assim, essas obras podem ser compreendidas a partir de uma relação
estabelecida, por meio da leitura, entre uma medicina oficial e a população de modo
geral. Os médicos, seus autores, igualmente, podem ser entendidos como mediadores
culturais, tal como nos termos de Gomes e Hansen (GOMES; HANSEN, 2016).
2
Se atentarmos ao fato de que boa parte da população não tinha acesso à educação
no século XIX, pode-se afirmar que estes manuais chegavam principalmente às famílias
com melhores condições sociais e econômicas. Porém, cabe lembrar que nem sempre as
leituras ficavam restritas a este círculo mais abastado, como ressaltou Regina Cotrim:
[...] faziam-se conhecidos nas conversas informais e nas trocas de receitas no
ambiente doméstico, para a recuperação de parentes, vizinhos ou escravos
doentes. Além disso, prestariam muitos serviços ao grande número de
indivíduos leigos que sobreviveram à custa de um conhecimento médico
informal. (GUIMARÃES, 2008, p. 831).
Como estratégia de convencimento, os médicos, autores destes manuais,
utilizavam de uma linguagem depreciativa para caracterizar todos aqueles que não
faziam parte da medicina acadêmica, como as parteiras, os curandeiros e outros. Ao
mesmo tempo em que depreciavam os demais praticantes de cura, firmavam sua
profissão perante o grande público e afirmavam o conhecimento científico como a única
“verdade”.
O
Guia da Mulher Pejada:
Estrutura e características
A obra
Guia da mulher pejada
de José Ricardo Pires de Almeida, foi inicialmente
publicada nas colunas do jornal
A Mãi de Familia. Jornal scientifico, litterario e illustrado
,
ao longo dos anos de 1881 a 1883. Esta obra foi publicada, em formato de livro, somente
no início do ano de 1884, pela Typographia e Lithographia Lombaerts & C., como
2
Angela de Castro Gomes e Patrícia Hansen (2016) definem como intelectuais mediadores aqueles
indivíduos que atuam como mediadores culturais. As autoras reconhecem que existem diversas situações
de mediação cultural realizadas por diferentes indivíduos nas mais diversas situações sociais. Entretanto,
essas pessoas não se reconhecem ou não o reconhecidas como intelectuais. Portanto, para fins de
delimitação, as autoras definem dessa maneira a categoria de 'intelectual':
registraram inúmeros anúncios veiculados nos periódicos da época. Esta edição em livro,
que integrava a coleção “Medicina para o povo” da editora, apresentou como título
Guia
da mulher pejada Preceitos hygiencios. Molestias e acidentes. Seu tratamento: alopático
pelo autor; homeopathico, pelo Dr. Castro Lopes; e dosimetrico, pelo Dr. José de Goes.
Precedidos do calendário da prenhez com o qual pode marcar o dia do parto, a época da
fecundação e o período em que se devem sentir os movimentos do féto
. Importa
esclarecer que essa edição da obra apresentou em sua primeira capa impressa a data
de 1882, mas no final do exemplar apresenta a data de 1884. De toda forma, considera-se
que a primeira edição veio a blico efetivamente no ano de 1884. O
Guia da Mulher
Pejada
ainda teve uma segunda edição, em 1895, igualmente publicada pela Imp. L.
Lombaerts.
A obra foi amplamente divulgada por meio de anúncios em jornais como
A Mãi de
Familia
e
A Estação
, e em periódicos de outras províncias brasileiras. No periódico
A
Estação
, por exemplo, foram localizados anúncios da obra até o ano de 1901, o que nos
leva a crer que pode ter sido uma obra bem aceita, ao menos pelo blico do Rio de
Janeiro.
O livro está estruturado da seguinte forma: prefácio, e mais duas partes,
Hygiene
da mulher pejada
, e
Moléstias da mulher pejada
. Na primeira parte,
Hygiene da mulher
pejada
, Pires de Almeida tratou sobre todas as questões referentes à higiene da mulher
pejada, contemplando sete pontos: o ar, o vestuário, os banhos, a alimentação, exercícios
físicos, o moral das pejadas, e desejos ou caprichos da mulher grávida. Na segunda parte,
Moléstias da mulher pejada
, foram discutidas as moléstias próprias da gravidez e as
maneiras de combatê-las, por meio de fórmulas de medicamentos que poderiam ser
encomendadas pela mulher. As receitas foram apresentadas a partir de três linhas de
pensamento ou formas de concepções médicas: a linha alopática por Pires de Almeida; a
homeopática, por Antonio de Castro Lopes
3
; e a dosimétrica, por José de Goes
4
.
O termo pejada era utilizado, no século XIX, para designar a mulher grávida. O
principal objetivo da obra era ser, tal como o título o anunciava, um guia para a mulher
em seu estado de gestação. A ideia era a de que, a mulher informada pelos preceitos
higiênicos, pudesse manter sua saúde e a de seu bebê. De acordo com Pires de Almeida,
uma das principais causas de mortalidade materna e infantil no período era a escassez de
3
Antonio de Castro Lopes (1827-1901): poeta, filólogo, e professor de latim no Colégio de Pedro II. Publicou
Conferências sobre a homeopatia
, em 1882. Apresentou nas Conferências Populares da Glória, na Escola
Pública da freguesia da Glória, as conferências
Ensino superior
, em 29/05/1881, e
Doses imponderáveis e
sua eficácia
em 27/11/1881.
4
José de Góes foi autor do
Guia de medicina Dosimetrica
(1880), vice-presidente honorário do Instituto
Dosimetrico de Paris e atendia na Pharmacia Especial S. José (Rua o José nº61), na cidade do Rio de
Janeiro.
informações científicas que pudessem informar às mulheres a maneira ‘correta’ de
cuidar de seu próprio corpo e do de seus filhos.
É importante relembrar que, em termos de conteúdo, os fascículos do
Guia da
mulher pejada
publicados no jornal
A Mãi de Familia
, e as edições em livro de 1884 e a de
1895, apresentavam algumas diferenças. No periódico foi publicado apenas, o que depois
veio a ser a primeira parte do livro, a
Hygiene da mulher pejada
. As moléstias da gravidez
e as receitas de medicamentos não foram incluídas na versão veiculada pelo periódico.
Para a seleção e análise desta obra de Pires de Almeida, fizemos a escolha pela
edição de 1884, por ter sido essa a primeira edição publicada em formato de livro, e que
foi amplamente anunciada em diversos periódicos do Rio de Janeiro e de outras
províncias.
O
Guia da mulher pejada
nos anúncios da imprensa
O
Guia da mulher pejada
, quando foi publicado, em 1884, em formato de livro, foi
amplamente anunciado em diversos periódicos do Rio de Janeiro e alguns de outras
províncias do Império. Foram localizados anúncios da obra até o ano de 1904. A grande
frequência de anúncios, nos mais diversos periódicos, pode ser considerado como um
indício da circulação e divulgação da obra.
No jornal
A Folha Nova
, em 1884, foi reproduzido um trecho do
Guia da mulher
pejada
, no qual tratava sobre o uso dos espartilhos, comentando a necessidade de
combater seu uso excessivo (
A Folha Nova
, 1884, p. 2). Em fevereiro de 1884, o periódico
Brazil. Órgão do Partido Conservador
anunciou a publicação da obra de Pires de
Almeida, destacando a importância do conteúdo por essa divulgado:
O Sr. Dr. Pires de Almeida, clinico desta cidade e vantajosamente conhecido
acaba de publicar uma
Guia da mulher pejada
, que nos parece de muita
utilidade, pois além de expor os phenomenos que acompanham a gravidez, e as
enfermidades que lhe são próprias, aponta os remédios a tomar para combater
esses malles e a hygiene a observar para chegar á terminação do estado sem
maiores accidentes. (Órgão do Partido Conservador, 1884, p. 2).
Da mesma forma, nesse mesmo periódico,
Brazil. Órgão do Partido Conservador
foi publicado, ainda em 1884, uma matéria que recomendava a leitura do
Guia da mulher
pejada
a toda senhora casada, por tratar-se de uma obra de grande importância prática
(1884, p. 3).
A Provincia do Espirito Santo
foi outro jornal que anunciou por diversas
vezes o a obra. Ao longo do ano de 1884, nesse periódico o
Guia da Mulher pejada
foi
anunciado dez vezes (anno III, n. 598, 1884). Em
A Mãi de Familia
, como nos referimos
anteriormente, foram inúmeros os anúncios veiculados entre os anos de 1884 a 1888. E
no jornal
A Estação
, os anúncios seguiram frequentes até o ano de 1901.
Em quase todos os anúncios da obra de Pires de Almeida, havia a referência à
coleção da qual a obra fazia parte, que no caso era intitulada de
Medicina para o povo
; e
seguiam o mesmo padrão de anúncio: tulo; logo abaixo, o subtítulo; a indicação ao
calendário da prenhez; o nome do autor; o preço e o lugar de venda. Principalmente nos
jornais
A Mãi de Familia
e
A Estação
os anúncios seguiam sempre esse mesmo modelo.
Assim como afirma Ozângela Silva (2017) existia, no século XIX, uma variedade de
maneiras de divulgar os livros nos periódicos. Alguns anúncios possuíam ilustrações,
outros descreviam a obra com textos longos, outros eram breves nas descrições dos
livros. Características como o formato, o tamanho e a linguagem presentes no anúncio
variavam de acordo com o público alvo.
Conforme indica a autora, existia um direcionamento do anúncio como forma
para sinalizar o público ao qual a obra se destinava. O
Guia da mulher pejada
, como se vê
nos anúncios referidos, era visivelmente destinado a um público específico: o povo. Não
era, dessa maneira, uma obra especializada, uma medicina para os doutores’. Pires de
Almeida possuía a pretensão de alcançar um público leigo, não especialista.
Como dito anteriormente, o
Guia da mulher pejada
foi publicado inicialmente no
jornal
A Mãi de Familia
, entre os anos de 1881 e 1883, o que torna imprescindível uma
reflexão a respeito deste instrumento de comunicação do período.
A imprensa, no século XIX, era um dos principais meios procurados pela
população para obter informações sobre os mais diversos assuntos, assim como se
tornara também um meio de entretenimento. A partir da segunda metade do século XIX,
começaram a aparecer jornais e revistas com o objetivo de tratar dos mais diversos
assuntos e alcançar uma grande variedade de blicos. Existiam periódicos de cunho
político, outros satíricos, os científico-literários, os especializados, os educativos, os de
vulgarização. Dessa forma, encontrava-se uma pluralidade e diversidade de periódicos,
sendo cada qual direcionado para diferentes públicos, como as mulheres, as crianças, os
trabalhadores, os médicos, os advogados, os professores, etc.
Como o periódico era um produto mais barato que o livro, o alcance de uma obra
reproduzida por esse meio poderia ser muito maior. Era, portanto, por meio dos
periódicos que os autores e suas produções passavam a ser conhecidos por diferentes
públicos e de diferentes segmentos sociais. O fato de Pires de Almeida ter publicado, a
princípio, sua obra nas colunas de um jornal, como
A Mãi de Familia
, pode indicar que
sua compreensão era de que por meio da imprensa sua obra alcançaria um público maior
e seria mais amplamente conhecida.
O jornal
A Mãi de Familia
(1879-1888) era naquele período um importante
instrumento de vulgarização científica para o público feminino. Nele se encontravam,
desde o início de seu funcionamento, matérias e artigos que tratavam de assuntos
médicos de interesse da mulher e da mãe de família. Através deste instrumento, seu
principal redator, o médico Carlos Antonio de Paula Costa,por meio de seus textos e de
outras autoridades científicas que atuavam como colaboradoras, buscavam instruir a
mulher segundo os preceitos científicos, para que assim pudesse criar melhor seus
filhos. Podemos entender, então, que este jornal, assim como outros do período, possuía
uma função pedagógica, que era a de educar e instruir a partir dos conhecimentos
científicos.
Pires de Almeida, ao utilizar esta estratégia de publicar sua obra inicialmente nas
colunas de um periódico e depois publicá-la no formato de livro, pode ter lhe
possibilitado a concretizão de seu objetivo, ou seja, tornar o conhecimento médico-
científico acessível para as mulheres grávidas, para que, uma vez informadas, pudessem
evitar e tratar de possíveis males decorrentes da gravidez.
A autoridade médico-científica de Pires de Almeida
De acordo com Jean Luiz Neves Abreu, no século XVIII os paratextos, ou seja,
tudo o que antecedia ao texto em si, como os prefácios e as introduções, possuíam um
papel primordial nos impressos de medicina luso-brasileiros (ABREU, 2013). Embora
esteja tratando sobre o século XVIII, podemos transportar as ideias de Jean Luiz Abreu
para interpretar um costume bastante comum no século XIX, que era a inserção de
paratextos nos livros. É importante analisar estes paratextos, pois nestes podemos
encontrar os objetivos, as principais intenções do autor, e conhecer a linha de
pensamento à qual estava vinculado. Além disso, também são textos importantes, pois
são neles que o autor se posicionava como autoridade científica.
A princípio, Pires de Almeida justificou a razão pela qual cabia a ele, médico,
estudar o feminino:
Deve-lhe, portanto, o médico mais considerações do que qualquer outro,
porque, pela índole dos seus estudos, pela interrompida pratica de sua honrosa
profissão, chegou a compreender o quanto é difficil desvendar os mysterios da
organisação feminina, o quanto é importante conhecel-os com certeza, e como
se torna doce e agradável levar o consolo ao coração afflicto e a saúde ao corpo
doente, daquellas que tantas sympathias despertam. (ALMEIDA, 1884, p. 5-6)
No século XIX, o médico passou a ser a principal autoridade científica a tratar de
assuntos relacionados ao corpo feminino. Segundo Martins e Rohden, esse processo tem
a ver com o contexto de produção científica a respeito das diferenças sexuais. A ideia de
dois sexos biológicos distintos pode ser contextualizada e é uma concepção que aparece
ao longo do século XVIII (MARTINS, 2004; ROHDEN, 2001). Até então, o modelo adotado
era baseado no padrão masculino, e desta forma nomeava órgãos para ambos os sexos
como testículos e ovários, por exemplo. Foi a partir do século XVIII que a mulher passou
a ser definida de forma específica, como um sexo diferente. Os médicos, portanto,
passaram a se autodenominar especialistas da mulher’, que nos faz compreender as
palavras acima de Pires de Almeida.
Mesmo com as dificuldades que eram atribuídas ao campo da moralidade, a
medicina dos séculos XVII, XVIII e XIX estava avançando na questão do estudo dos
órgãos, através da prática de dissecações que estava sendo realizada na Europa. Esses
conhecimentos eram amplamente divulgados nos manuais médicos especializados. Foi a
partir desses estudos que começaram a serem descobertas diferenças entre os sexos. Os
médicos se colocavam como as principais autoridades qualificadas para tratarem sobre
as questões relacionadas ao corpo.
Dessa forma, a partir de então, o corpo feminino passou a ser um objeto do
conhecimento científico, toda a produção em torno da sexualidade demonstrava como as
mulheres eram diferentes dos homens: “passagens como a puberdade, a gravidez e a
menopausa afetariam as mulheres de modo único e não haveria qualquer acontecimento
equivalente em relação aos homens". (FREITAS, 2008, p. 176)
Pires de Almeida expressou claramente sua visão a respeito das mulheres:
Disse-o alguém, e com espirito e rasão: a mulher é uma criança grande. Esta
expressiva phrase que, para os mais exigentes, envolve uma censura, importa o
seu melhor elogio.
por ventura cousa que mais nos interesse do que a tenra infância? na
creação um ser que mais direitos tenha á nossa estima, e mais carinhos e
cuidados nos inspire do que esses innocentinhos que mal conhecem a vida?
E porque?
Porque naquelle idade somos apenas um átomo lançado ao mundo; e seriamos o
brinco de todas as influencias physicas, a victima de todas as tempestades, sem
os desvelos constantes de nossos paes que robustecidos na luta soffrem
por amôr da frágil criança o choque de todos os ventos.
A mulher, porem, nunca perde essa quasi infância; em toda sua vida é um ser
indefeso, exposto, por um lado, ao embate das paixões que lutam para
conquistar-lhe o nobre coração, por outro lado, á destruidora acção de
moléstias insidiosas que minam-lhe o corpo, ou ás consequências do
desempenho das mais elevadas funcções que a natureza confiou ao seu
organismo; e que sobre serem as mais importantes para a espécie, porquanto
concorrem exclusivamente para garantia da perpetuidade são-lhe contudo
incommodas, dolorosas, e gastam rapidamente o viço da mocidade, quando não
cortam em hora muito prematura o fio de uma existência rica de esperanças e
illusões. (ALMEIDA,1884, p. 6-7)
A mulher era percebida por Pires de Almeida como ser que havia crescido, mas
não amadurecido. Pires de Almeida apresentou a mulher como um indivíduo que era, ao
mesmo tempo, exposto a paixões que lhe afligiam o coração e suscetível a diferentes
tipos de moléstias. Por essas razões, de acordo com o modo de pensar do médico, a
mulher deveria ter como seu conselheiro e amigo, a figura do médico.
Neste contexto, a medicina afirmava que a natureza da mulher e sua
particularidade sexual demandavam justificativas científicas e um regime de regulações
para que sua natureza não se desvirtuasse. Nesta perspectiva, o corpo feminino deveria
ser sempre “regulado, porque a medicina da época acreditava que, além de ser mais
frágil, era impressionável a qualquer motivação, fosse ela causada por emoções, pela
visão, pelo tato, enfim, um corpo sensível a qualquer impressão”. (MARTINS, 2004, p. 15)
O médico, nesse sentido, se colocava como conselheiro da mulher para todos os
aspectos de sua vida: aconselhavam sobre a maternidade - desde a gestação aos
cuidados com as crianças -, sobre comportamentos sociais, sobre a vestimenta, a vida
conjugal, as leituras, os passeios, etc.
Nesta perspectiva, os médicos podem ser considerados como os representantes
da ciência junto a essas mulheres. Pires de Almeida destacou a capacidade do médico em
dar atenção às mulheres:
Deve-lhe, portanto, o médico mais considerações do que qualquer outro,
porque, pela índole dos seusestudos, pela ininterrompida prática de sua honrosa
profissão, chegou a compreender o quanto é difícil desvendar os mysterios da
organização feminina, o quanto é importante conhece-los com certeza, e como
se torna doce e agradável levar o consôlo ao coração afflicto e a saúde ao corpo
doente, daquelas que tantas sympathias despertam. (ALMEIDA, 1884, p. 5-6)
O médico Pires de Almeida prosseguiu afirmando a autoridade médica e a
importância do critério científico na prática da chamada especialidade ginecológica:
O que acabámos de dizer, representando a unanime opinião dos médicos, e o
juízo amadurecido dos philosophos, é a base de um critério scientifico a que
deve necessariamente obedecer todo aquelle que, por predilecção, gôsto, ou
necessidade, consagre suas lucubrações ao que hoje se chama especialidade
gynecologica, cujo fim o é mais do que o estudo contínuo do organismo da
mulher em todas suas manifestações, para acompanhal-as quando marchem
regularmente ao objetivo physiologico, para modifical-as quando perturbações
mais ou menos graves converte-n´as em perigo para a saúde. O primeiro objeto
constitue a gynecologia
hygienica
; o segundo, a gynecologia
pathologica
.
(ALMEIDA, 1884, p. 8-9)
Além de ter defendido a ideia de que caberia ao médico ‘guiar’ a mulher, por ela
ser uma criatura indefesa e suscetível a diferentes tipos de moléstias, Pires de Almeida
também tratou da maternidade. Competiria ao médico defender e instruir a mulher
porque ela poderia carregar em seu ventre um ser, o qual poderia representar o futuro
do país e trazer benefícios para a sociedade:
Ponderando mais que no ventre materno encerra-se sempre um’alma, uma
grande intelligencia as vezes, aquella com seu immortal destino, esta com suas
ardentes inspirações e faculdades capazes de imaginar novos mundos, ou
remontar-se ás altas regiões da sciencia, desentranhando novos segredos,
dilatando os horisontes á actividade febril das gerações que se succedem, como
não julgar digna de todo interesse a saúde da mulher, da qual dependem destino
tão nobres quanto desconhecidos? (ALMEIDA, 1884, p. 7-8)
Embora Pires de Almeida se dirigisse à mulher, seu principal interesse estava
localizado na criança, na sua boa constituição física e moral. Como o discurso médico do
período defendia a ideia de que a mulher fora criada para ser mãe e, que por isso, a
maternidade era algo que fazia parte de sua natureza, a mulher deveria preservar e
cuidar de sua saúde, para que quando se encontrasse no estado de gestação, a saúde de
seu filho estivesse preservada (MARTINS, 2004; ROHDEN, 2001).
Outra questão que também estava presente nesta discussão sobre a maternidade
era a questão da nacionalidade. A criança era considerada o futuro da nação e, por isso,
caberia aos seus principais cuidadores os pais uma atenção com sua saúde e
desenvolvimento. Medicina e Estado agiram em conjunto para abolir os hábitos
considerados nocivos às crianças. De acordo com Patricia Sanine e Elen Castanheira
(2018), a medicalização da família teria se dado por meio da infância, com o intuito de
serem implantados novos hábitos nas relações entre pais e filhos.
5
O trabalho de Luiz Lima Vailati (2010) é relevante para pensar sobre a relação
entre morte infantil e costumes sociais nos oitocentos. De acordo com o autor, o
discurso médico propôs uma concepção diferente da que era corriqueira nas tradições e
costumes sociais. Para boa parte da população do período, a morte infantil era algo
benéfico. Por conta da influência da religiosidade católica, acreditava-se que um
indivíduo que morresse enquanto criança ganharia o paraíso. Muitas das fontes
levantadas pelo autor indicavam a predominância desse pensamento em muitas famílias
da época. Essas ideias começaram a se modificar a partir do empenho que muitos
médicos fizeram em mostrar outra noção sobre a morte infantil. O discurso médico, de
acordo com o autor, sustentou que as altas taxas de mortalidade infantil não poderiam
ser percebidas como algo benéfico ou como materialização da vontade divina. Os
médicos mostraram que os pais eram peças fundamentais na criação e no cuidado dos
filhos e que boa parte dos problemas relacionados à saúde da criança poderia ser evitada
se os cuidados fossem baseados nos preceitos científicos.
5
Entretanto, somente no início do século XX, é que foram implantadas pelo Estado brasileiro, medidas
mais pragmáticas com relação à infância. Foi somente na década de 1920, por exemplo, que foram iniciados
os serviços de higiene infantil, e a proibição do trabalho fabril para menores de doze anos. E mais tarde, na
década de 1930, foi criada a Diretoria de Proteção à Maternidade e à Infância. Cf. SANINE; CASTANHEIRA,
2018.
Crítica à roda dos expostos, combate ao aborto criminoso e ao infanticídio, crítica
aos costumes sociais, que enxergavam a morte infantil como algo positivo, defesa de
uma nova concepção de família, que teria a criança como prioridade, investimento em
um discurso que definia a mulher a partir de sua função reprodutiva, foram algumas das
ideias defendidas por estes médicos do XIX. Estas ideias circulavam em jornais e revistas
para o grande público, em livros, em conferências e foram aos poucos estimulando
mudanças nas famílias.
Para definir melhor seu objeto de estudo, Pires de Almeida assim descreveu os
principais assuntos do livro:
A hygiene da mulher pejada, as moléstias que lhe são próprias, e seu
tratamento, constituirão, pois o assumpto deste livro, maneiro, singelo, despido
de pretenções scientificas, porém cheio de preceitos praticos para bem
encaminhar as futuras mães, de modo a não deixarem expostas aos azares da
rotina, da indiscrição, ou mesmo das preoccupações, a vida e a saúde de dous
seres, dos quaes dependem a um tempo a riqueza da família e o bem da
sociedade. (ALMEIDA, 1884, p. 9)
Neste trecho, é possível observar de maneira muito clara a noção de vulgarização
do XIX. Muitos homens de letras que se dispuseram a escrever sobre ciência para um
público leigo partiam da noção de que a linguagem deveria ser amena, bem didática,
adaptada ao público. Outra característica da vulgarização que pode ser percebida neste
trecho é a ideia de utilidade da ciência. Pires de Almeida afirmou que muitos preceitos
práticos estavam presentes no livro para bem encaminhar as futuras mães. É a própria
concepção de um conhecimento que seria aplicado no dia a dia que faz da obra de Pires
de Almeida uma produção baseada na ideia de vulgarização das ciências.
A higiene e as moléstias da mulher pejada
Na primeira parte da obra, intitulada de
Hygiene da mulher pejada
, Pires de
Almeida procurou apresentar as orientações sobre a saúde da mulher e conselhos de
como a mulher deveria manter sua saúde para que pudesse ter uma gestação saudável.
Logo no início do texto, destacou os benefícios que aquelas mulheres que seguissem os
preceitos poderiam alcançar. E, ressaltou, também, o quão nocivo seria ao organismo se
as mulheres não atentassem a esses preceitos:
Se a mulher vive ordinariamente conforme esses preceitos, e mantém ou
acautela sua saúde, precavendo-se de tudo quanto possa modificar-lhe
maleficamente o organismo, pouco mais te a accrescentar quando o novo
estado se desenvolva de modo normal; - porém, o mais certo e commum é
esquecerem-se os preceitos hygienicos, porque não a mulher como
também o homem muito pouco cuidam de prevenir os resultados de qualquer
incidente orgânico enquanto gozam saúde, e nada ameaça interromper a
perfeita harmonia que parece reinar na marcha das funcções physiologicas.
(ALMEIDA, 1884, p. 31)
Pires de Almeida afirmou, ainda, a importância de se observar os meios chamados
preventivos para tornar a saúde da mulher mais segura e melhor preparada para o parto.
O ato de informar-se faria com que a mulher evitasse problemas com a saúde dela e a do
feto enquanto estivesse no período gestacional. Por isso, ele assinalou a importância dos
preceitos higiênicos. Para Pires de Almeida era inaceitável que a mulher grávida
esquecesse esses preceitos. Dessa forma, ele elencou diversas regras que deveriam ser
seguidas pela mulher grávida. Assim, a primeira regra formulada foi:
[...] a mulher não mudará absolutamente de regimen, costumes e hábitos,
contanto que sejam racionaes, e não estejam em opposição com os princípios
da hygiene geral. [...] Continue, pois, o seu regimen habitual, observando apenas
algumas minúcias que nos propomos esclarecer aqui. Nada receie: deixe as
cousas seguirem livremente seu curso, que a natureza terminará a sua obra com
a mais perfeita e admirável regularidade. (ALMEIDA, 1884, p. 34)
Entre as ressalvas que Pires de Almeida apresentou estava a questão da
realização de sangrias, desaconselhada para as mulheres grávidas. Da mesma forma,
ressaltou a importância de a mulher relatar os incômodos da gravidez ao médico, e não
às comadres, pois segundo ele estas eram amigas inescrupulosas que as aconselhavam
de forma negativa. Pires de Almeida descreveu desta maneira as comadres:
Não nada que mais damnos cause á mulher grávida do que os máos
directorios, e estes proporcionam-lhe amiudadamente as intimas ignorantes,
quando não malignas e supersticiosas, que apoderando-se da confiança das
famílias impõem-se, fazendo prevalecer suas absurdas idéas e
mesinhas
intragáveis ás autorisadas instrucções do homem de sciencia.
E como, infelizmente, em muitas povoações, nas capitaes de nossas províncias,
e o que mais é ainda no seio da própria corte, affrontando ostensivamente a
Policia, fervilham as comadres, não me cançarei de prevenir contra ellas as
senhoras que aspirem manter uma gestação feliz, e chegar ao termo sem
lamentar passo algum indiscreto, nem tropeçar com fataes aberrações.
Todos os dias registram-se casos em que a mão fatal d’essas especuladoras
escreve a sorte de uma família inteira na lapide de uma sepultura, sacrificando
mães estremecidas e esposas que apenas acabam de perder os encantos da
virgindade. (ALMEIDA, 1884, p. 39-40)
Essa visão negativa conferida às mulheres que auxiliavam no parto era dirigida na
maioria das vezes àquelas que atuavam sem autorização, as ditas comadres. Apesar de a
maioria dos médicos, do século XIX, não ter feito distinção entre as parteiras, Maria
Lucia Mott (1998), em seu estudo, conseguiu identificar, pelo menos, cinco tipos distintos
de parteiras neste período. De acordo com a autora, no início do XIX, haveria as
práticas
,
que possuíam extensa experiência, mas atuavam sem autorização; as
ocasionais
, que
eram mulheres que, por conta das circunstâncias, acabavam realizando o parto de
alguém próximo de seu convívio social, mas não eram parteiras de ofício; as
licenciadas
que exerciam com autorização legal, mas sem ter passado por um exame; as
examinadas
,
parteiras práticas que haviam prestado o exame depois de comprovada experiência; e as
diplomadas
, que em geral eram mulheres estrangeiras, que haviam feito o curso de
partos no exterior ou no Brasil (MOTT, 1998).
Após suas considerações sobre a presença das comadres” nos partos, Pires de
Almeida prosseguiu, em sua obra, apresentando os conselhos e modos de viver para a
mulher pejada. A primeira indicação que o médico fez foi sobre a qualidade do ar ao qual
a mulher grávida poderia estar exposta. Em lugares cuja atmosfera não reunisse as
devidas condições de pureza, por exemplo, Pires de Almeida afirmava que isso poderia
causar abortos e nascimentos de crianças raquíticas e deformes. A mulher pejada
também deveria evitar estar em lugares úmidos e mal arejados.
Outra observação feita por Pires de Almeida foi em relação à altura em que
deveria estar a residência da mulher pejada, a qual não poderia ser acima do nível do
mar, pois em tal condição poderia ser ativada a circulação do sangue da mulher e
prejudicar a nutrição do feto. Pires de Almeida não indicava a residência em tais locais e
entendia que estes poderiam ser lugares apenas para realizar passeios e excursões.
Entre os exemplos de lugares interessantes para mulheres grávidas, Pires de Almeida
indicou Petrópolis como um local que serviria para moradia, e Teresópolis como uma
região que serviria para passeios. Entre os lugares considerados como impróprios para a
mulher pejada, Pires de Almeida referiu-se aos lugares pantanosos, pois estes seriam
capazes de causar febres intermitentes, que poderiam ser transmitidas ao feto.
No verão, em dias muito quentes, não era aconselhável despir-se ao chegar em
casa após um passeio e procurar um ponto da casa para se refrescar, pois isto poderia
causar catarros, reumatismos, resfriamento repentino no feto, hemorragias, congestões
intensas e abortos. A mulher também não poderia, depois de uma noite de sono, colocar
os pés diretamente no chão, pois também esta ação poderia ocasionar estes mesmos
problemas. Da mesma forma, a pejada teria que evitar lugares com grande aglomeração
de pessoas, como as festividades na igreja e os espetáculos teatrais.
Dando continuidade aos conselhos, Pires de Almeida tratou, igualmente, da
vestimenta da mulher pejada:
No estado de gestação, a mulher deve sacrificar todos os caprichos da moda, á
conservação de sua saúde e da do filho. Este princípio é absoluto. Nem o receio
de passar por baldo de gosto, nem as exigências da alta sociedade, e muito
menos as chamadas leis do bom tom, poderão legitimar o uso de certos
accessorios e enfeites, ou o feitio especial de vestuários que mais ou menos
directamente embaraçam o desenvolvimento do feto, ou alteram as formas da
mãe, sobretudo em órgãos ou regiões destinadas a desempenhar importante
papel na physiologia da geração.
A mãe pertence n’essas occasiões a si e ao filho, - nada tem que ver com a moda
nem com o bom tom; basta-lhe ser escrava de ambos a maior parte de sua vida;
sacuda o seu jugo ao menos durante esse período, relativamente curto, porém
muito importante, em o qual as menores particularidades de sua existência, os
pormenores mais insignificantes devem caminhar pura e exclusivamente de
maneira a facilitar o termo feliz do trabalho maravilhoso que se está realisando
dentro do seu organismo. (ALMEIDA, 1884, p. 55-56)
A principal recomendação de Pires de Almeida era de que o vestuário das
mulheres pejadas deveria ser composto por roupas largas e folgadas, para que não
comprimissem o ventre e os seios. Neste ponto, Pires de Almeida tratou de um aspecto
que interessava a todas as mulheres que sabiam ler e escrever, especialmente as mais
abastadas, que era o tema da moda.
A moda, no século XIX, alcançou um lugar de destaque na vida de muitas
mulheres. Estava presente em periódicos como o
Jornal das Senhoras
,
A Estação
, o
Jornal
das Famílias
, entre outros. Como reitera Maria Helena Camara Bastos (2002), a
preocupação com a moda era uma manifestação das modificações que ocorriam com a
presença da mulher na sociedade. Ela passou a frequentar outros lugares para além do
ambiente privado, como o teatro, as óperas, os bailes e os saraus literários.
Pires de Almeida, ainda tratando do assunto do vestuário, apresentou várias
observações sobre o uso do espartilho. Entendia que esta era uma peça do vestuário
feminino que causava muitos problemas para o corpo e que interferia em etapas
importantes da gestação, como a preparação dos seios para o aleitamento:
Os seios eram tão fortemente comprimidos, que chegava a perder o bico, e
em alguns casos a atrophiar a glândula; as falsas costellas, e até mesmo as
ultimas verdadeiras, soffriam não menor compressão com o fim de apurar o
talhe. E, quando a moda o exigia, reduzia-se a cintura á inverossimel delgadeza
de ser abarcada com as duas mãos, sem se reflectir que órgãos tão importantes
como o estomago, fígado e baço soffriam n’esse estado tal aperto que quasi
embaraçava-os de funcionar. (ALMEIDA, 1884, p. 66)
Pires de Almeida, baseado em sua autoridade médico-científica, sugeriu que o
espartilho, ao menos no período de gravidez, deveria ser banido do vestuário da
gestante, por prejudicar os seios e o ventre.
A discussão sobre o aleitamento ganhou amplitude no século XIX e fez com que
muitos médicos discorressem sobre o tema. Amamentar o próprio filho, ao invés de
recorrer a uma ama de leite, era uma questão presente nas páginas dos livros e dos
jornais e revistas voltados ao grande público. Amamentar tornou-se um ato de amor e de
responsabilidade. A ‘verdadeira mãe’ deveria amamentar seu filho. Partindo desta
maneira de pensar, Pires de Almeida deu algumas indicações de como a mulher deveria
preparar os seios para a amamentação:
Pires de Almeida expôs sua preferência pela amamentação natural, de modo que a
mulher deveria recorrer a outros mecanismos para estimular a saída do leite nos
casos em que realmente houvesse necessidade.
O jornal estudado por Karoline Carula (2013),
A Mãi de Familia,
é um bom
exemplo de como essa discussão sobre a amamentação estava sendo tratada em um
periódico cujo público alvo eram as próprias mulheres. Este jornal tinha como principal
objetivo fazer com que as mulheres se tornassem ‘verdadeiras’ mães de família. De
acordo com seu principal redator, Carlos Costa, as mulheres estavam muito ocupadas se
preocupando com sua aparência e esquecendo-se de seu principal dever, que era o de
ser mãe. Diversos artigos do jornal demonstravam como, principalmente, a questão do
aleitamento era considerada uma das principais ações da mãe, que deveria estar disposta
a dar o seio para o filho.
Pires de Almeida, fundamentado em seu conhecimento médico, estava buscando
desmitificar uma tradição popular, que era encarada como um conhecimento verdadeiro
por parte da população naquela época. O que estamos sugerindo é que, por meio do
Guia
da mulher pejada
, a ciência, o conhecimento científico reconhecido pelos médicos da
época, estava adentrando a muitos lares brasileiros e talvez modificando costumes, que
muito estavam enraizados no cotidiano da maior parte dos brasileiros.
Nesta primeira parte de sua obra, Pires de Almeida tratou de diversos assuntos
referentes à saúde da mulher, tais como, o ar e como as mulheres pejadas deveriam
evitar locais com pouca ventilação ou ar viciado; a vestimenta considerada
cientificamente correta para ser usada durante a gravidez, de modo que evitasse
problemas ao feto; os diferentes tipos de banhos e os que a mulher pejada deveria
escolher, como o banho morno que seria o mais adequado; o cuidado com a alimentação;
a necessidade das mulheres pejadas se exercitarem durante a gravidez, realizando
caminhadas em locais com boa ventilação; questões relacionadas ao moral da mulher
pejada e o cuidado com os locais frequentados para evitarem-se emoções fortes que
poderiam acarretar em consequências, como abortos; e, por último, os desejos ou
caprichos da mulher grávida. Em relação aos dois últimos pontos, Pires de Almeida
incluiu a figura do esposo na narrativa, dando conselhos também para ele, de forma a
promover um bom desenvolvimento da gestação.
Pires de Almeida concluiu essa parte do livro reinterando seu desejo de que a
leitura daquela obra pudesse promover uma aliança entre o médico e a mãe: o primeiro,
com a ciência, a segunda, com o amor e cuidado, e ambos trabalhando em razão da
criança, considerada como futuro cidadão:
Tudo quanto neste sentido pudermos alcançar empregando, nós a convicção, e
ellas a vontade bem dirigida, será de proveito real: a gestação caminhará com
regularidade; serão menores os incidentes; o parto em dia próprio; vindo,
finalmente, á luz uma criança com todas as garantias de saúde que pôde
ambicionar por um lado a sciencia -, por outro, o amor materno. (ALMEIDA,
1884, p. 145)
Na segunda parte da obra, intitulada de
Molestias da mulher pejada
, Pires de
Almeida procurou tratar das moléstias que poderiam ocorrer ao longo desenvolvimento
da gestação e de como a mulher pejada deveria proceder diante das situações.Entre os
conselhos iniciais, aconselhou que se evitasse os remédios caseiros, pois somente “á
sciencia compete resolver”. (ALMEIDA, 1884, p. 147)
Embora tenha buscado sugerir algumas formas de combater certas moléstias,
considerava como o meio mais eficaz se prevenir destes problemas:
Cumpre não deslembrar que a observância de uma boa hygiene, nos termos em
que a exposemos na primeira parte deste livro, é o meio mais efficaz para
prevenir muitas indisposições, e até mesmo moléstias, sobretudo nas senhoras
que habitam os grandes centros, as quaes por sua constituição
excessivamente bil, seos hábitos sedentários, e falta de boas condições no ar
respirável estão mais propensas a toda casta de desordens funccionais.
(ALMEIDA, 1884, p. 150)
Entre as principais moléstias que poderiam surgir durante a gravidez, Pires de
Almeida listou as seguintes:
[...] os vômitos e as náuseas, o ptyalismo ou salivação, a gastralgia, a anorexia, a
diarrhéa, cólicas e a prisão do ventre; hemorrhoidas, edema ou inchação das
extremidades inferiores, a oppressão do peito, dores nos seios, vertigens e
desmaios, câimbras, e vários outros estados que se referem, uns ao systema
circulatório, outros ao nervoso. (ALMEIDA, 1884, p. 151)
Pires de Almeida, usando uma linguagem simples e uma narrativa didática,
começou a tratar das moléstias da mulher pejada, discorrendo inicialmente acerca dos
vômitos e das náuseas. Neste sentido, comentou sobre a época da gestação em que tais
moléstias podiam aparecer, os horários ao longo do dia e o período em que cessavam.
Da mesma forma, aconselhou quanto às formas de se proceder para combater a
diversas moléstias. Entre essas, os vômitos eram um dos males que acometiam as
pejadas. Para solucionar o problema, o médico indicava o uso dos antiespamódicos,
como o xarope de flor de laranjeira. Além disso, a mulher pejada deveria evitar tomar
bebidas aromáticas, como o chá da índia, a macela, o louro, a erva doce, a cidreira e a
tília, que poderiam causar uma “relaxação do estomago” (ALMEIDA, 1884, p. 158) e
favorecer os vômitos. Pires de Almeida indicou, igualmente, o uso de gelo para evitar os
vômitos, sugerindo à mulher pejada o consumo de sorvete ou o gelo em pedaços após as
refeições. Os passeios na roça também foram sugeridos como um meio de evitar este
problema, pois as caminhadas ao ar livre facilitariam os movimentos viscerais e
tornariam os órgãos mais tolerantes.
Além das náuseas e dos vômitos, Pires de Almeida expôs sobre outro problema
que também afetavam as mulheres pejadas, que era a “salivação ou ptyalismo”
(ALMEIDA, 1884, p. 172). Embora não se tratasse de um problema grave, Pires de Almeida
sugeriu que a mulher pejada tomasse algumas colheres de água aromática, como as de
flores de laranjeira e de hortelã. Além disso, a mulher pejada poderia tomar uma colher
de magnésia pela manhã, ou colocar na boca um pedaço de goma arábica ou de açúcar
cândi.
Pires de Almeida descreveu outras moléstias e incômodos próprios do período da
gravidez e apresentou receitas para combater todos esses males, como a diarreia, a
constipação, edema ou inchação das extremidades inferiores, vertigens, dores nos seios,
dores nas cadeiras, dores de cabeça, nevralgias, palpitações do coração, opressão do
peito, tosse nervosa, insônia.
Pires de Almeida concluiu o
Guia da mulher pejada
expressando sua preocupação
com relação ao cuidado com as mulheres pejadas. Suas considerações se dirigiam
especialmente àquelas pessoas que, na ausência de um médico, fossem cuidar das
mulheres pejadas. Destacou que para que fosse possível corrigir os problemas ocorridos
ao longo da gestação e utilizar adequadamente as fórmulas descritas na segunda parte da
obra, era importante atentar para alguns aspectos da mulher pejada, como idade,
temperamento, compleição, hábitos, época da gestação, coincidência ou não da moléstia
com outra enfermidade.
Conclusão
Através da análise da obra
Guia da mulher pejada
, do médico José Ricardo Pires de
Almeida, procurou-se estudar sobre a forma pela qual o discurso médico buscou
aproximar-se das mulheres. Nesse sentido, o contexto da vulgarização científica, na
segunda metade do século XIX, nos permitiu pensar em Pires de Almeida como um
vulgarizador das ciências, ao procurar, por meio de suas publicações, tornar o
conhecimento científico mais acessível às mulheres. Neste contexto, a imprensa
desempenhou um papel importante na vulgarização dos conhecimentos, como podemos
perceber na análise da produção intelectual de Pires de Almeida, que foi, em grande
parte, publicada em periódicos da segunda metade do século XIX.
Por meio da análise do
Guia da mulher pejada
, nos foi possível corroborar a ideia
de que os manuais médicos, voltados para o público leigo, faziam parte do processo de
busca de legitimação da medicina acadêmica em relação às denominadas práticas
populares de cura. Esses manuais, direcionados às mulheres, buscavam ocupar um
espaço no qual era possível a presença de outras mulheres, como as parteiras ou
comadres, que cuidavam da saúde das mulheres.
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