meio da floresta em uma espécie de assembleia noturna ou Sabbat
. (MELLO E SOUZA,
1987, p. 12-13, 20-21). A bruxa, ao contrário da feiticeira, era – ela mesma – a fonte do
mal porque, através do pacto que realizou, se transformava na sacerdotisa do demônio.
Sobre essa sacerdotisa, Michelet dirá que, a velha era seu título honorífico, ainda que
fosse bem jovem. (MICHELET, 2004, p. 147, grifo do autor).
A ideia da mulher enquanto um ser frágil, débil e mais predisposto às tentações
demoníacas pode ser compreendido através de discursos ocidentais existentes em
tempos ainda mais antigos. Jean Delumeau informa que desde o século XIII, na Europa,
com a entrada das ordens mendicantes na cena do mundo religioso cristão, a
evangelização foi desenvolvida a partir dos sermões e que, estes, ganharam ainda mais
importância com a chegada das reformas religiosas europeias. Infelizmente, esse sistema
de conversão estava impregnado de elementos misóginos ao feminino, descrito como um
ser predestinado ao mal (DELUMEAU, 2009, p. 477). São Bernardino de Siena (século
XV) e Alvarado Pelayo (1330) são alguns dos nomes que vão difundir uma ideia negativa
da mulher antes mesmo da caça às bruxas europeia, apontando como ato legítimo o
homem bater em sua esposa e/ou garantir que ela se mantivesse ocupada em casa,
realizando trabalhos domésticos, para que não pensasse em coisas ruins. Além disso, a
consideravam testemunho menos crível diante do testemunho de um homem, assim
como afirmavam que a mulher era ministra da idolatria e responsável pelo homem
cometer apostasia
e se distanciar de Deus (DELUMEAU, 2009, p. 477- 483).
A relação das mulheres com o mundo demoníaco, desta forma, não era uma
novidade no século XV, mas ganhou mais propagação com a publicação da bula Summis
desiderantes affectibus (1484) de Inocêncio VIII. As palavras de Inocêncio foram
reforçadas na obra Malleus Maleficarum (1487), escrita pelos dominicanos Sprenger e
Kramer. Neste trabalho, os autores franciscanos apoiaram a existência do incubus e do
sucubus no pacto demoníaco, além de dizer que uma simples acusação, ou queixa sem
Segundo a definição de Sabbat de Ginzburg, destacamos a seguinte passagem: “Bruxas e feiticeiros
reuniam-se à noite, geralmente em lugares solitários, no campo ou na montanha. Às vezes, chegavam
voando, depois de ter untado o corpo com ungüentos, montando bastões ou cabos de vassoura; em outras
ocasiões, apareciam em garupas de animais ou então transformados eles próprios em bichos. Os que
vinham pela primeira vez deviam renunciar à fé cristã, profanar os sacramentos e render homenagem ao
diabo, presente sob a forma humana ou (mais frequentemente) como animal ou semi-animal. Seguiam-se
banquetes, danças, orgias sexuais. Antes de voltar para casa, bruxas e feiticeiros recebiam ungüentos
maléficos, produzidos com gordura de crianças e outros ingredientes.” (GINZBURG, 2007, p. 9).
Afirma Macarena Cordero que, José de Acosta, na obra Procuranda Inodorum Salute, distinguirá entre
duas classes de nativos: a primeiro diz respeito aos não convertidos, aos quais os clérigos deveriam
cristianizar mediante a persuasão e a compreensão; a segundo tipo diz respeito aos apóstatas, isto é,
aqueles que já conheciam a palavra de Deus mas se distanciaram da fé em Cristo. A respeito desses
últimos, ainda segundo Acosta, deveria haver maior rigor em sua repressão e castigo. Entretanto, admite
que os costumes e práticas andinas que não fossem nocivas à moral e à doutrina cristãs, poderiam ser
mantidas (CORDERO FERNÁNDEZ, 2012, p. 368).