Segundo a pesquisa da historiadora Roseli Stella (1998), a partir de 1560, data que
marca o início do aldeamento de São Miguel de Ururaí, fundado pelo padre José de
Anchieta
, o famoso jesuíta teria sido também um visitante dos povos viventes na região.
Em primeiro lugar, o local era propício para fixar um aldeamento, pois, “dada a facilidade
de comunicação através dos cursos fluviais e obtenção dos víveres indispensáveis à
sobrevivência”. (STELLA, 1998, p. 331). E sobre Anchieta, a carta escrita por ele e
endereçada ao padre Geral Diogo Lainez de 12 de junho de 1561, declara, que “depois de
estar em Piratininga alguns dias, nos mandou o padre visitar as aldeias dos índios, nossos
antigos discípulos”. (ANCHIETA, 1984, p. 175). É certo que na mesma carta, Anchieta
alega que após a dispersão dos indígenas para diversos locais, os mesmos retornam aos
antigos costumes, sendo esse um ponto importante o qual demonstra que os indígenas
não eram meros receptáculos submissos da catequese. Porém, a doutrinação cristã por
conta disso fica prejudicada
. São Miguel, aldeamento jesuítico, poderia ter passado por
essa crise de ordem doutrinária cristã, porém, as visitas dos padres da Companhia de
Jesus poderiam reverter à situação ora apresentada por Anchieta. O próprio nome do
aldeamento remete-se ao arcanjo celestial São Miguel, segundo o catolicismo, o chefe da
guarda celeste, o guerreiro dos céus. Essa é a “marca” da presença católica na região a
leste na Vila de São Paulo. Igualmente “as igrejas constituíam, desde o século XVI,
marcos de fundação das aldeias indígenas cujos nomes, grosso modo, derivavam dos
santos aos quais elas eram dedicadas”. (ALMEIDA, 2010, p. 97). Já para Stella,
a visita de Anchieta à aldeia indígena pode ter ocorrido até no dia de São Miguel,
orago da predileção de Anchieta, embora a escolha do padroeiro das novas
povoações, necessariamente, não estivesse relacionada ao dia da fundação das
mesmas. (STELLA, 1998, p. 331).
É o próprio José de Anchieta que, em carta com datação de 1585 dando
informação da Província do Brasil para nosso Padre, menciona São Miguel com a sua
quantidade populacional aproximada. Segundo o jesuíta,
Autor imprescindível que no passado deu testemunho da fundação do aldeamento de São Miguel pelo
Padre José de Anchieta foi o Frei Agostinho de Santa Maria. Que disse: “Para isto lhe dispôs o mesmo Santo
Padre Anchieta quatro aldeias, a primeira encomendou ao Arcanjo São Miguel [...] lhe dizia missa todos os
dias, um dia em uma, outro em outra”. (SANTA MARIA, 1723, Tomo X, p. 161-162).
Entende-se que no contato entre indígenas e europeus não ocorreu a assimilação, onde um grupo étnico
se incorpora noutro, perdendo sua identidade étnica anterior. (OLIVEIRA, 1968). Mas, o que teria
acontecido foi o processo de identificação, ou seja, assume por enquanto os dados culturais recebidos e
depois os abandona (HALL, 2006). Também, sendo mais forte a identidade cultural de um grupo, maior
será a resistência (FERREIRA, 2008). Ou como salientou Martín-Barbero que nem toda a assimilação do
hegemônico pelo subalterno é signo de submissão, assim como a mera recusa não é de resistência.
(MARTÍN-BARBERO, 2001).