Cooperativismo em Itaú/RN:
a contribuição da
COAPIL para o desenvolvimento a partir da
percepção dos associados e cooperativados
Cooperativism in Itaú/RN
:
the contribution of
COAPIL
to development based on the perception of
associates and cooperactivated
SILVA, Aysla Gabriela Lopes da
*
BARRETO FILHO, Boanerges de Freitas
*
RESUMO: Evidências históricas indicam que o
município de Itaú/RN já contou com uma das
cooperativas mais importantes do Alto Oeste
Potiguar. Esta pesquisa tem como objetivo
“Identificar as contribuições da COAPIL
(Cooperativa Agropecuária de Itaú Ltda.) para o
desenvolvimento de Itaú/RN, a partir da
percepção dos agentes diretamente
envolvidos”. Para tanto o trabalho se baseou
em pesquisa bibliográfica e por meio de
levantamento no que restou do acervo
documental da Cooperativa, além de pesquisa
de campo e realização de entrevistas com 17
integrantes da Cooperativa. Os dados e
informações coletadas evidenciam a
importância da COAPIL na geração de
empregos, constituindo, por muito tempo,
como a principal geradora de postos de
trabalho no munipio e áreas adjacentes. Por
outro lado, mostrou-se incapaz de promover
alterações substanciais na estrutura
socioeconômica. Na verdade, tornou-se um
instrumento para a manutenção do poder
político e para reafirmação das diferenciações
sociais.
PALAVRAS-CHAVE: Cooperativismo; Emprego
e renda; Relações de trabalho;
Desenvolvimento.
ABSTRACT: Historical evidences indicate that
the municipality of Itaú/RN has already
counted on one of the most important
cooperatives of the Upper West Potiguar. This
research aims to "identify the contributions of
COAPIL (Cooperativa Agropecuária de Itaú
LTDA.) to
the development of Itaú/RN, from
the perception of the agents directly involved".
For this work was based on bibliographic
research and through a survey of what
remained of the documentary collection of the
cooperative, besides field research and
conducting interviews with 17 members of the
cooperative. The data and information
collected evidence the importance of COAPIL
in the generation of jobs, constituting, for a
long time, as the main generator of jobs in the
municipality and adjacent areas. On the other
hand, it proved incapable of promoting
substantial changes in the socio-economic
structure. In fact, it has become an instrument
for the maintenance of political power and for
the reaffirmation of social differentiations.
KEYWORDS: Cooperativism; Employment and
income; Labor Relations; Development.
Recebido em: 03/08/2019
Aprovado em: 04/10/2019
*
Bacharela em Ciências Econômicas pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), campus
de Pau dos Ferros, estado do Rio Grande do Norte (RN), Brasil. E-mail: gabyaysla@gmail.com.
*
Mestre em Planejamento e Dinâmicas Territoriais no Semiárido da Universidade do Estado do Rio Grande
do Norte (UERN), estado do Rio Grande do Norte (RN), Brasil. Professor do Departamento de Economia da
UERN, campus de Pau dos Ferros (RN). E-mail: boanerges.sms@hotmail.com.
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, Assis/SP, v.6, nº2, p.478-495, jul./dez., 2019
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Introdução
O cooperativismo é uma das palavras-chave para se compreender a democracia,
pois a constituição de uma cooperativa é um ato voluntário entre pessoas que têm
interesses comuns e almejam, por meio da união, solucionar problemas do cotidiano
e/ou potenciar arranjos produtivos, econômicos, culturais, etc. A constituição e o
funcionamento de uma cooperativa requerem a participação, a colaboração, a união
entre as pessoas e exatamente por apresentar tais características é que o
cooperativismo pode ser entendido como um movimento que busca constituir uma
sociedade justa em bases democráticas (SCHMIDT; TEODORO; MIYAZAKI; GAFFURI;
NAZZARI; BERTOLINI, 2005).
O cooperativismo tem uma relevância significativa na economia brasileira, sendo
um sistema capaz de alinhar o desenvolvimento humano ao sustentável, devido aos seus
princípios universais de origem e de evolução (MATOS; NINAUT, 2008).
No Brasil, o movimento cooperativista se iniciou oficialmente com a Cooperativa
Econômica dos Funcionários Públicos de Ouro Preto, em Minas Gerais, em 1889 e outra
no Rio Grande do Sul, em 1902. A primeira cooperativa de crédito foi criada na cidade de
Nova Petrópolis, pelo Padre suíço Theodor Amstad, e até hoje permanece em
funcionamento (MAGALHÃES; DAUDT; PHONLOR, 2009).
Para que o cooperativismo fosse difundido e se tornasse reconhecido, em 1969,
foi criada a Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), entidade que representa e
congrega o segmento cooperativista brasileiro. No ano de 1998 surgiu o Serviço Nacional
de Aprendizagem do Cooperativismo (SESCOOP), com o objetivo de estimular o ensino e
formação profissional dos trabalhadores associados em cooperativas (MATOS; NINAUT,
2008).
O Nordeste brasileiro se caracteriza por ser uma região de contrastes, conhecida
pelo seu clima, ameno no litoral e semiárido no interior, vegetação predominantemente
de caatinga (a mata branca do período seco e que renasce no período chuvoso) e
manifestações culturais fortes e marcantes nos diversos espaços internos, também pela
exuberância e riqueza de uma parte diminuta da sociedade e por apresentar uma
significativa concentração de pessoas pobres e extremamente pobres, especialmente nos
municípios do semiárido.
O Nordeste de contrastes também se materializa por meio das diferentes formas
que as cooperativas assumiram na região. Na acepção democrática, em que a adesão
voluntária e o interesse comum prevaleceram, foram constituídas inúmeras cooperativas
e associações com motivações edificantes para o enfrentamento das dificuldades e
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problemas econômicos e sociais vivenciados por milhares de famílias nordestinas. De
outro lado, também é verdade que, uma parte das cooperativas do Nordeste foi
organizada por representantes da elite que tomaram o comando e o cargo mais alto
existente na estrutura para angariar benefícios econômicos e políticos. Em tal acepção,
pode-se dizer que parte do cooperativismo no Nordeste enfrenta dificuldades, pois o
principal objetivo de uma cooperativa é trabalhar em benefício dos cooperados e da
comunidade e não para ser utilizada como instrumento de transferência de recursos
financeiros para o bem próprio de seus comandantes (DANIEL; GAL, 1981).
Acredita-se que a ação de uma cooperativa pode contribuir para a promoção do
desenvolvimento, inclusive nas áreas que apresentam carências socioeconômicas
diversas, como são os casos, quase sempre, dos municípios do interior do RN. Pelas
evidências de que o município de Itaú/RN já contou com uma das cooperativas mais
importantes do Alto Oeste Potiguar, tem-se o seguinte objetivo: Identificar as
contribuições da COAPIL (Cooperativa Agropecuária de Itaú Ltda.) para o
desenvolvimento de Itaú/RN, a partir da percepção dos agentes diretamente envolvidos.
A COAPIL teve participação destacada na economia itauense durante muitos anos
e influiu na vida de milhares de pessoas (diretamente na economia de Itaú/RN e
indiretamente no cotidiano regional, através da aquisição de praticamente toda a
produção de caju dos municípios do entorno). Pela relevância histórica, econômica e
social do empreendimento, percebe-se a necessidade de resgatar as contribuições que a
COAPIL teve para a economia do município ao gerar empregos e renda e para os
municípios do entorno através da aquisição das castanhas e do pseudofruto do caju.
O atual presidente
1
da COAPIL foi importante fonte para o resgate da atuação da
Cooperativa, pois tem exercido a presidência por mais de duas décadas. A referida fonte
foi entrevistada na fase inicial do levantamento, sendo solicitadas informações cadastrais
dos sócios e trabalhadores e demais referências que pudessem facilitar a localização de
potenciais entrevistados.
Saliente-se também que muitos sócios e trabalhadores da cooperativa não
residem mais em Itaú/RN e muitos outros já faleceram. Outro aspecto que merece
consideração é o fato de a COAPIL estar passando por uma série de dificuldades de
atuação, inclusive com possibilidade de leilão da estrutura existente para pagamentos de
dívidas, comprometendo, assim, a capacidade de ampliação das operações de compra e
venda dos produtos, bem como, pela impossibilidade de captação de recursos
1
Tem-se que reconhecer a possibilidade de avaliações exageradamente positivas sobre a atuação da
COAPIL, sobretudo, nos períodos de auge. Para minimizar os possíveis excessos, os dados e informações
que foram repassados pelo presidente foram checados com outros cooperativados (sócios e
trabalhadores).
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(empréstimos/financiamentos). Tais aspectos resultam em certa aversão por parte de
alguns membros em tratarem sobre a temática.
A partir das informações fornecidas pela presidência atual da Cooperativa, foram
identificadas 17 (dezessete) pessoas que tiveram atuação na COAPIL e que se dispuseram
a participar da pesquisa, sendo que as entrevistas foram realizadas entre os meses de
fevereiro e março de 2019, com 10 (dez) sócios (participaram da Diretoria e/ou foram
sócias fundadoras) e 7 (sete) trabalhadores que atuaram na fábrica de beneficiamento.
Optou-se pela entrevista semiestruturada para manter o foco sobre as
contribuições da COAPIL para o município de Itaú/RN e para o entorno, mas também por
permitir maior flexibilidade na abordagem e, assim, facilitar a exploração de aspectos
novos relatados pelos entrevistados. Para Triviños (1987, p. 152) a entrevista
semiestruturada “[...] favorece não só a descrição dos fenômenos sociais, mas também
sua explicação e a compreensão de sua totalidade [...]”. Neste sentido, as perguntas
foram elaboradas com o propósito de identificar as contribuições da COAPIL para o
desenvolvimento de Itaú/RN, a partir da percepção dos agentes diretamente envolvidos
(sócios e trabalhadores).
Tal método se mostrou estratégico para recuperação da história da COAPIL,
principalmente em virtude das dificuldades vivenciadas pela Cooperativa ao longo dos
últimos anos em que muitos dados e informações (atas, documentos contábeis etc.)
foram sendo descartados e/ou perdidos. Assim, o material remanescente nos arquivos da
Cooperativa teve que ser complementado com as percepções dos agentes diretamente
envolvidos no funcionamento da COAPIL.
A pesquisa adotada no trabalho é do tipo mista, pois incorpora elementos
quantitativos e qualitativos, com predomínio deste último.
Cooperativismo: evolução histórica e características
O cooperativismo nasceu tendo como motivação original criar alternativas para
que grupos socialmente mais vulneráveis pudessem alcançar condições mais
satisfatórias de vida. Nesse aspecto, o movimento cooperativista nasceu como resultado
da união dos trabalhadores frente ao capitalismo industrial, baseado na exploração da
força de trabalho da classe operária, cujo objetivo capitalista é buscar cada vez mais a
exploração da força de trabalho e consequentemente, o lucro (MARX, 2011, apud
HÜMMELGEN, 2016).
Para Porto e Ferreira (2015, p. 325-326):
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A doutrina cooperativista passou a se manifestar, de maneira mais objetiva, na
primeira metade do século XIX, quando o continente europeu passava por um
momento ímpar de sua história, vivenciando um contexto de divergência sócio-
político-econômico ocasionado pela Revolução Industrial, a partir da metade do
culo XVIII. Este período é marcado pelo avanço tecnológico. O avanço
tecnológico, ao mesmo tempo, que fomentou a produção em massa, gerando
riqueza a uma classe chamada de burguesia, provocou o desemprego de
milhares de trabalhadores que tiveram sua força de trabalho substituída pelas
máquinas, gerando grande miséria e exploração da força de trabalho e, por
conseguinte, uma massa de excluídos. Diante dessa realidade, os trabalhadores
viram na ajuda mútua uma forma de lutar contra essa realidade, deste modo,
passaram a organizar-se a fim de lutar contra a miséria, garantir a
sobrevivência, além de atender suas necessidades de saúde, alimentação,
moradia, lazer, e, por fim, melhores condições de vida e inclusão social.
O cooperativismo, como se conhece hoje, surgiu na metade do século XIX em
Rochdale, na Inglaterra, com o propósito da criação de uma sociedade que pudesse ser
autossuficiente e apoiasse outras sociedades com o mesmo propósito (SINGER, 2010,
apud HUMMELGEN, 2016).
Diante da consolidação do capitalismo e da nova relação de produção, emergiu a
ideia da criação de uma organização formal que estabelecesse regras, normas, e
princípios que respeitassem, sobretudo, os valores do ser humano (BENATO, 1994, apud
HUMMELGEN, 2016), considerando que a exploração do trabalho assalariado
deteriorava as condições de vida dos trabalhadores que passavam a viver de forma cada
vez mais precária. É por essa perspectiva que se entende o cooperativismo como uma
tentativa de suavização da relação de exploração que caracteriza o modo de produção
capitalista, cujo corolário é a busca do lucro e que tem como origem a exploração do
trabalho alheio.
Assim, devido às inúmeras necessidades socioeconômicas vivenciadas cada vez
por mais pessoas, estabeleceram-se as possibilidades para que, por meio da união de
pessoas com interesses afins, fossem testados novos arranjos, tais como as cooperativas
de produção agrícola ou industrial, comercialização de produtos e serviços,
disponibilização financeira e de crédito, entre outras (RICCIARDI; LEMOS, 2000, apud
HUMMELGEN, 2016).
De acordo com Barreto Filho (2017, p. 02):
[...] o cooperativismo pode ser compreendido como uma resposta às
adversidades vivenciadas por milhões de famílias alijadas e excluídas da divisão
das riquezas produzidas no capitalismo. É, neste sentido, uma alternativa
reformista, embora diferenciada, de inserção no moderno sistema produtor de
mercadorias.
O cooperativismo se relaciona com a busca por inserção econômica por meio do
estabelecimento de relões de confiança entre as pessoas que têm propósitos
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razoavelmente parecidos. Assim, os indivíduos se unem em função do alcance de
situações que sejam agradáveis para todos os membros, atuam conjuntamente para
atingir as metas programadas. Destaque-se que “as cooperativas de trabalhadores geram
benefícios não econômicos para os seus membros e para a comunidade em geral, que
são fundamentais para contrariar os efeitos desiguais da economia capitalista” (SANTOS,
2002, p. 3).
O cooperativismo tem por objetivo a solução de problemas sociais por meio da
criação de comunidades de cooperação. Tais comunidades seriam formadas por
indivíduos livres que se encarregariam da gestão, operacionalização, divisão de
atribuições e distribuição dos resultados para os membros (SANDRONI, 1996). Nesse
sentido, verifica-se que o objetivo principal de uma cooperativa não é a obtenção de
lucro.
De acordo com Bialoskorski Neto (1998, p. 3):
A cooperativa é um empreendimento diferente das empresas encontradas na
economia e que visam resultados e lucros. Esta forma organizacional é baseada
em princípios doutrinários oriundos dos socialistas utópicos associacionistas e
tem como lastro o ideário da igualdade, da solidariedade, fraternidade, e da
liberdade.
Ainda de acordo com o autor, o empreendimento cooperativo:
[...] não comporta a ideia de uma propriedade privada, mas sim de uma co-
propriedade, privada e comum, não com o objetivo da geração de lucros, mas
sim com o intuito de oferecer condições para que cada uma das unidades
autônomas associadas a esse empreendimento possam se estabelecer
eficientemente no mercado (BIALOSKORSKI NETO, 1998, p. 3).
Barreto Filho (2017, p. 5) chama atenção para o seguinte:
[...] observa-se que a forma organizativa determina uma significativa diferença
da empresa capitalista, mas não se pode desconsiderar que o empreendimento
cooperativo atua num ambiente capitalista por excelência e, desta forma,
submete-se a lógica de acumulação e é subordinada ao status quo.
Sendo um arranjo diferenciado, faz-se necessário conhecer os princípios que
regem o cooperativismo. Cruzio (2005), citado por Porto e Ferreira (2015, p. 327-328),
aponta o seguinte:
a) Adesão livre e volunria as cooperativas são organizações voluntárias,
abertas a todas as pessoas aptas a usufruir dos serviços e dispostas a aceitar as
responsabilidades dos sócios, sem discriminação social, racial, política ou
religiosa e de gênero.
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b) Controle democrático pelos sócios as cooperativas são organizações
democráticas, controladas por seus sócios, que participam ativamente no
estabelecimento de suas políticas e nas tomadas de decisões. Homens e
mulheres, eleitos como representantes, são responsáveis para com os sócios.
c) Participação econômica dos sócios os sócios [que] contribuem de forma
equitativa controlam democraticamente o capital de suas cooperativas. Parte
desse capital é prioridade comum das cooperativas.
d) Autonomia e independência as cooperativas são organizações autônomas
de ajuda mútua, controladas por seus membros. Entrando em acordo
operacional com outras entidades, inclusive governamentais, ou recebendo
capital de origem externa, devem fazê-lo de forma a preservar seu controle
democrático pelos sócios e manter sua autonomia.
e) Educação, treinamento e informação as cooperativas proporcionam
educação e treinamento aos sócios, dirigentes eleitos, administradores e
funcionários, de modo a contribuir efetivamente para o seu desenvolvimento.
f) Cooperação entre cooperativas as cooperativas atendem aos seus sócios
mais efetivamente e fortalecem o movimento cooperativo trabalhando juntas,
através de estruturas locais, nacionais, regionais e internacionais. Este princípio
estimula a organização e expansão do cooperativismo, como também a união
das cooperativas em busca de expandir o mercado de trabalho, além de
fortalecer suas estruturas para vencer as concorrências e ganhar espaço no
mercado.
g) Preocupação pela comunidade as cooperativas trabalham pelo
desenvolvimento sustentável de suas comunidades, através de políticas
aprovadas por seus membros. As cooperativas, por meio de seus cooperados,
possuem a responsabilidade de fomentar o desenvolvimento local da
comunidade de forma sustentável, considerando a responsabilidade social e
ética, contribuindo significativamente para a fomentação do tripé do
desenvolvimento sustentável: social, econômico e ambiental.
Pode-se dizer que são inatos ao homem lutar pela sobrevivência e buscar a
melhoria de suas condições de vida e, exatamente, por tais características é que
inúmeras experiências foram sendo testadas e aperfeiçoadas ao longo do tempo, dentre
as quais, pode-se afirmar que as mais bem sucedidas foram aquelas que aglutinaram os
esforços dos indivíduos. Por tal perspectiva o cooperativismo/associativismo pode ser
compreendido como uma resposta às adversidades vivenciadas por milhões de famílias
excluídas da divisão das riquezas produzidas no capitalismo. É, nesse sentido, uma
alternativa reformista, embora diferenciada, de inserção no moderno sistema produtor
de mercadorias.
O cooperativismo no Brasil
No que se refere à evolução da prática cooperativista, tem-se que, no Brasil, a
formação de cooperativas é regulamentada por lei desde 1907, constituindo-se, portanto,
numa atividade reconhecida pelo Estado desde o início do século XX. Saliente-se que,
mesmo antes da regulamentação oficial, já existiam cooperativa no país. A primeira
cooperativa do Brasil foi criada no ano de 1889, na cidade de Ouro Preto/MG, e era uma
cooperativa de consumo. Decorridos mais treze anos surgiu a primeira cooperativa de
crédito do país, sendo instalada no estado do Rio Grande do Sul. Em relação às
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cooperativas agropecuárias, têm-se as primeiras iniciativas no ano de 1906, ou seja, já
após a regulamentação legislativa (MAGALHÃES; DAUDT; PHONLOR, 2009).
Em 2 de dezembro de 1969 foi criada a Organização das Cooperativas Brasileiras
(OCB)
2
, órgão da sociedade civil, sem fins lucrativos e com neutralidade política e
religiosa. Tratava-se, até então, da única representante e defensora dos interesses do
cooperativismo nacional. Tal demora para a constituição de entidade nacional
representativa dos interesses das cooperativas sinalizam para o fato que, no país, o
sistema cooperativo demorou a se difundir pelo amplo território nacional (MAGALHÃES;
DAUDT; PHONLOR, 2009).
Embora tenha demorado em deslanchar no país, tem-se que o segmento se
diversificou e ganhou peso na economia nacional. A força do cooperativismo brasileiro
pode ser observada na Tabela 1, manifestando-se pelo número de cooperativas, de
cooperativados e também pela quantidade de pessoas que emprega.
Tabela 1. Panorama geral do cooperativismo brasileiro por número de cooperativas
existentes nos diferentes ramos, por número de cooperativados e por pessoal
empregado.
Ramo
Cooperativa
Cooperados
Empregados
Agropecuário
1.618
1.017.481
198.654
Consumo
179
2.585.182
12.629
Crédito
929
8.941.967
60.237
Educacional
270
53.403
3.367
Especial
8
321
8
Infraestrutura
135
1.006.450
5.692
Habitacional
284
106.659
577
Produção
239
5.777
2.960
Mineral
97
23.515
182
Trabalho
943
188.435
943
Saúde
805
238.820
103.015
Transporte
1.357
98.713
9.835
Turismo e Lazer
23
760
11
Total
6.887
14.267.483
398.110
Fonte: (OCB, 2018).
São números muito representativos, destacando-se a quantidade de cooperativas
agropecuárias, com 1.618, e de transportes, com 1.357, em relação ao número de
cooperativas por setor ou ramo de atuação. Em relação ao número de cooperados, tem-
se as de crédito e consumo como as que mais congregam pessoas e, pelo número de
empregados, observa-se novamente as cooperativas agropecuárias, com 198.654
pessoas, e as de saúde com 103.015 pessoas empregadas.
2
“As cooperativas brasileiras são disciplinadas pela Lei 5.764/71, as quais possuem a OCB como
representante nacional e as OCEs, por exemplo, Organização das Cooperativas do Estado do Rio Grande
do Norte] como representantes estaduais” (PORTO; FERREIRA, 2015, p. 328).
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Além da relevância socioeconômica as cooperativas também têm ampla dispersão
geográfica:
De acordo com a OCB (2010), as cooperativas se fazem presentes em todas as
regiões do país, sobressai como a maior detentora do número de cooperativas a
região Sudeste, em termos percentuais, o equivalente a 34%. Em seguida
aparece a região Nordeste, correspondendo a 26%, portanto, as regiões Sudeste
e Nordeste são as reges que detêm o maior número de cooperativas
existentes no Brasil, ou seja, juntas comportam mais de 50% desse total
(PORTO; FERREIRA, 2015, p. 329).
Também por apresentar acentuada capacidade de mobilização dos fatores
disponíveis nas diferentes áreas, inclusive oportunizando perspectivas para que áreas
até então pouco integradas ao circuito de valorização do capital, observa-se que o
cooperativismo passou a ser encarado como um instrumento para promover o
desenvolvimento.
Conforme Porto e Ferreira (2015, p. 325):
[...] as cooperativas vêm se constituindo como um valioso instrumento
estimulante da força de trabalho, pois minimiza o empobrecimento de muitas
populações, através da inovação. Enfim, por meio do conhecimento e de novas
práticas educativas é possível incentivar desenvolvimento local de forma
sustentável, respeitando o meio ambiente, a comunidade e os princípios da
ética.
Assim, quando a concepção de Desenvolvimento Local se consolida como uma
perspectiva para áreas pouco integradas ao circuito de acumulação do capital, tem-se na
organização de cooperativas uma forma de aglutinar os recursos escassos disponíveis e
encontrar mecanismos e formas para potenciar a economia local.
De acordo com Barreto Filho (2017, p. 6):
A lógica é, predominantemente, aproveitar as oportunidades de inserção no
processo de globalização, reconhecendo-se que o processo de integração
local/global é tamm contraditório. Neste sentido, tem-se que as relações
interpessoais podem ser consolidadas num ambiente mais afeito ao
cooperativismo/associativismo e o capital social pode florescer e produzir
resultados mais satisfatórios quando se conhece os recursos e diferenciais que
podem ser mobilizados para a melhoria da qualidade de vida dos indivíduos. Em
outros termos, o cooperativismo pode servir como catalisador das energias
existentes e pode potencializar os resultados no enfrentamento da pobreza.
A partir de tal perspectiva, percebe-se que as áreas mais atrasadas do país
poderiam recepcionar empreendimentos deste tipo com propósitos de atender às
necessidades de parte da população menos favorecida e/ou dinamizar a economia, com
vistas a se alcançar o desenvolvimento.
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O cooperativismo no Nordeste
A região Nordeste caracteriza-se por ser uma região de contrastes, marcado por
forte heterogeneidade e complexidade não somente em termos de clima, vegetação,
tipografia, cultura, mas, especialmente, em termos econômicos (SILVA; SALOMÃO;
MCINTYRE; GUERREIRO; PIRES; ALBUQUERQUE; BERGONSI; VAZ, 2003). Nesse
espaço, o cooperativismo foi fortemente influenciado pelo poder político da classe
dominante, posto que, em muitas circunstâncias, verificou-se a criação de cooperativas e
associações como medidas para facilitação de acessos a recursos, quase sempre, de
origem pública e que servem para a manutenção do status quo.
A primeira cooperativa que foi instalada oficialmente no Nordeste foi em
Camaragibe, no estado do Pernambuco, em 1894, tinha como fundador Carlos Alberto
Meneses. De acordo com os autores, as cooperativas do Brasil passaram por alguns
problemas, mais as cooperativas do Nordeste foram mais afetadas pelas circunstâncias
socioeconômicas mais precárias, destacando-se a grande concentração de pessoas com
baixa escolaridade, além de inúmeros indicadores que a caracterizam como uma região
de baixo desenvolvimento e, adicionalmente, com condições climáticas adversas, como
no semiárido (DANIEL; GAL, 1981)
.
As cooperativas, apesar de vários associados, tinham apenas um chefe,
geralmente, um político ou alguém com maior poder econômico e que se tornava um
verdadeiro “dono da cooperativa”. Assim, aqueles que detinham o poder econômico
acabavam por exercer o controle das cooperativas, reunindo grupos de pessoas apenas
para efeito de obtenção de recursos. Os cooperativados, em muitos casos não tinham
noção alguma do que era cooperativismo ou como poderia influenciar nos rumos da
cooperativa, apenas servindo como verdadeira massa de manobra para contemplar os
interesses do “dono”. Em virtude de tal arranjo, acontecia com frequência nas
sociedades cooperativistas do Nordeste que numa mesma localidade existiam duas
cooperativas agropecuárias: uma chefiada por um político de um partido e a outra por
político de outro partido adversário (DANIEL; GAL, 1981).
Os traços salientados pelos autores apontam para o mandonismo praticado pelos
grupos oligárquicos que impunham um controle vigoroso sobre as populações nos
diversos espaços do interior nordestino, constituindo-se numa característica importante
para se compreender as limitações que existiam para boa parte dos cooperados
exercitarem os direitos e compartilharem dos benefícios nos mesmos moldes dos líderes
políticos que, em geral, eram os organizadores e gestores de tais empreendimentos.
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Também é conveniente destacar que nem todas as cooperativas tiveram suas
ações associadas diretamente ao comando de algum grupo político, destacando-se as
iniciativas que tiveram a frente religiosos (padres e bispos) e outras tantas iniciativas que
brotaram das dificuldades vivenciadas por inúmeros grupos sociais, como quilombolas,
indígenas e trabalhadores sem-terra.
A COAPIL no município de Itaú/RN
O município de Itaú está localizado no estado do Rio Grande do Norte, mais
precisamente na Microrregião de Pau dos Ferros. Seu território encontra-se a 361 km da
capital, Natal, e sua área territorial é de 133 km², limitando-se com os municípios de
Apodi/RN, Riacho da Cruz/RN, Tabuleiro Grande/RN, Rodolfo/RN e Severiano Melo/RN
(IBGE, 2018).
Imagem 1. Localização de Itaú/RN Mapa do Rio Grande do Norte.
Fonte: ABREU, 2018.
De acordo com o IBGE (2010), a população era de 5.850 habitantes, com
densidade demográfica de 43,97 hab./km². Com relação à economia, o IBGE (2018)
mostra que o Produto Interno Bruto (PIB), no município de Itaú-RN era de R$
23.147.210,00 e o PIB per capita era de R$ 3.899,46.
Segundo o IBGE (2010), no ano de 2010, das pessoas ocupadas na faixa etária de
18 anos ou mais, 29,98% trabalhavam no setor agropecuário, 0,19% na indústria extrativa,
5,59% na indústria de transformação, 9,82% no setor de construção, 1,35% nos setores de
utilidade pública, 11,96% no comércio e 38,49% no setor de serviços. Percebe-se que o
setor agropecuário é bastante significativo para a economia local, ficando em segundo
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lugar no que ocupa maior número de trabalhadores, sendo assim tem um destaque
positivo dentre os demais setores da economia.
A COAPIL (Cooperativa Agropecuária de Itaú Ltda.) foi fundada em 15 de
setembro de 1968, com 30 sócios, sendo o primeiro presidente o Sr. Nelson Diógenes
Dantas (ATA DE CONSTITUIÇÃO DA COAPIL). A área prioritária de atuação era a
cajucultura, destacando-se o beneficiamento da polpa, o beneficiamento da castanha do
caju, produção de ração de caju (aproveitando o bagaço da fruta) e viveiros de mudas de
cajueiros (Presidente da COAPIL em 2019, entrevista, 15 jan. 2019).
Figura 2. Cooperativa Agropecuária Itaú Ltda. (COAPIL).
Fonte: JOTA MARIA, 2018.
A cooperativa dispunha de, aproximadamente, 150 operários, número que
aumentava na época da colheita do caju, gerando emprego diretamente e indiretamente,
inclusive com aproveitamento deo de obra proveniente de municípios vizinhos.
Destaque-se que os empregos gerados não exigiam especialização, resultando em
oportunidades para ocupação de mão de obra pouco qualificada, como, por exemplo,
carregadores (responsável por carregar/descarregar os caminhões) e cortadeiras que
realizavam o trabalho do corte do caju.
A origem da fruta do caju era de municípios vizinhos, como: Severiano Melo
(sendo o maior produtor da região), Portalegre, Apodi, Rodolfo Fernandes e alguns
municípios do Ceará como Potiretama, Iracema e Alto Santo, além da produção
proveniente da zona rural de Itaú/RN.
Os principais destinos da polpa de caju eram para o grupo EBBA em Aracati/CE,
Grupo Tropfruit em Estância/SE, Pindorama em Alagoas e Brassucos em Feira de
Santana/BA. A polpa saía da processadora em Itaú/RN já semielaborada nas carretas
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pipa de aço inox com a capacidade de 30 toneladas cada. A COAPIL continua produzindo
polpa de caju, beneficiamento de castanha, viveiros de mudas de cajueiros e produção de
ração. Tendo 35 trabalhadores, números que aumenta indiretamente com a colheita,
podendo alcançar 600 empregos para colher 5 mil caixas de caju (como apanhadores de
caju, transportadores de outras cidades e os que fazem a colheita do caju).
A colheita do caju-anão precoce começa no primeiro dia de junho até o final de
dezembro. A COAPIL funciona nas segundas, quartas e sextas-feiras. O atual presidente
é o Sr. José Praxedes Fernandes, trabalhando há 25 anos na Cooperativa.
O insucesso econômico vivenciado pela COAPIL se agravou a partir da estiagem
de 2012 a 2017, que influenciou na baixa disponibilidade do caju, sendo que os sucessivos
anos de seca refletiram na economia e na redução das atividades da Cooperativa,
consequentemente, com implicações que podem comprometer sua existência.
Resultados
Os sócios entrevistados entraram na Cooperativa nos anos de 1975 a 2007, com a
maioria se concentrando no período de 1975 a 1999. A forma de ingresso foi por convite
da Diretoria e tendo como justificativa o fato de possuírem terras com parte destinadas a
cajucultura. Os entrevistados mais antigos apontaram que foi por meio das relações
pessoais que mantiveram com o então presidente (que foi prefeito do município por
diversos mandatos) que resolveram aceitar o convite para ingressarem na Cooperativa.
A geração de renda proveniente da ação da COAPIL permitiu que parte dos sócios
alcançasse certa estabilidade financeira, inclusive contribuindo para a abertura de
negócios distintos da atividade da cajucultura. Para alguns que atuaram diretamente na
gestão da Cooperativa, também foram importantes os conhecimentos obtidos na
atividade, pois teriam servido para se tornarem empreendedores.
Segundo o que foi apurado, a COAPIL oferecia outras vantagens para os sócios,
além dos preços mais satisfatórios, como a estruturação de um supermercado, aspecto
que favorecia para a realização de compras na cidade em épocas em que o comércio
dispunha somente de pequenas mercearias. Também contavam com o serviço de corte
das terras, realização de pequenas obras nas propriedades por meio de tratores da
Cooperativa e obtenção de financiamentos nos bancos para repasse aos associados.
Sobre o processo de tomada de decisões, observou-se que foram apontadas a
realização de reuniões nos próprios galpões da Cooperativa, mas que o processo
decisório ficava muito à mercê da ação dos presidentes. Apontaram a realização das
reuniões como um sinalizador de um ambiente democrático, mas apurou-se que as
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diretrizes já eram estabelecidas pela ação dos presidentes e alguns membros da Diretoria
e que os momentos de reunes eram mais para repassar o que já tinha sido feito.
Ademais, indicaram a ação política de um ex-presidente como elemento positivo
para a Cooperativa e que após a perda de representatividade política, a situação
econômica foi piorando e praticamente inviabilizando a existência da COAPIL. A
percepção dos associados sobre a importância de um político para o “sucesso” da
Cooperativa evidencia que a construção de laços de confiança entre os cooperativados
foi, no mínimo, insuficiente, pois colocavam a ação da liderança política como
indispensável para o empreendimento.
Além da perda de representatividade potica que foi apontada como um dos
elementos contribuintes para o declínio econômico da COAPIL, também foi indicado que
a seca que assolou a região em muitas oportunidades (inclusive no período recente, de
2012 a 2017) representou um fator para as dificuldades vivenciadas nos últimos anos.
Ademais, salientaram que a má gestão também comprometeu o funcionamento da
Cooperativa e que seria necessária uma renovação no quadro administrativo para tentar
resgatar a credibilidade da COAPIL.
A reprodução literal de um trecho de uma das entrevistas se faz necessária, pois é
elucidativo sobre a perda de foco e de credibilidade da Cooperativa: “A COAPIL perdeu o
significado de cooperativismo, onde se voltou mais para o centro político, do que mesmo
para beneficiar os agricultores e os trabalhadores da cooperativa” (CAJU
3
, 2019).
A avaliação dos sócios entrevistados foi que a COAPIL desempenhou importante
papel na economia local, acreditando que os resultados foram positivos para os
agricultores cooperativados, uma vez que a Cooperativa também beneficiava a polpa,
resultando em maior renda, além de fabricar ração para os animais. Apurou-se que, caso
a COAPIL não realizasse o processamento do pseudofruto, ocorreria o desperdício, pois
não seria possível vendê-lo para locais distantes. Também significou um importante
agente comprador das castanhas produzidas na região, conseguindo melhores preços
para o produto beneficiado que, até então, era repassado para atravessadores.
Para os sócios entrevistados os benefícios econômicos mais importantes gerados
pela COAPIL foram os empregos, pois, segundo informaram, a maior parte da população
da cidade era empregada na Cooperativa e atraía pessoas de outros municípios que
buscavam trabalhar no beneficiamento da produção. Em virtude da grande quantidade de
pessoas empregadas, o comércio teria se beneficiado e o dinheiro circulava na própria
cidade.
3
Nome real omitido para preservação da fonte.
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Como a geração de postos de trabalho foi apontada como a principal realização da
COAPIL, buscou-se a coleta de dados e informações diretamente dos trabalhadores que
atuaram na Cooperativa.
Instigados para apontarem a divisão de gênero entre os trabalhadores nos
períodos de maiores movimentações nas atividades agroindustriais da COAPIL,
verificou-se que a presença de mulheres na indústria de beneficiamento era muito
representativa e que, em alguns períodos, trabalhavam mais mulheres do que homens.
Apurou-se nas entrevistas realizadas com os trabalhadores entrevistados que o
período de ingresso na Cooperativa ocorreu entre o ano de 1980 e 1992 e que antes de
ingressarem não estavam trabalhando, sendo que todos afirmaram a ausência de outras
possibilidades de conseguirem postos de trabalho na cidade. Apontaram que nos
momentos de auge da COAPIL, certamente, mais de 300 operários trabalhavam na
agroindústria, constituindo-se como principal fonte de geração de emprego e renda na
cidade.
Os entrevistados também salientaram que a COAPIL era organizada, que a
Diretoria e os presidentes cuidavam de todas as atribuições gerenciais. Também
indicaram que o ex-presidente que exerceu vários mandatos como prefeito do município
era figura-chave para o sucesso do empreendimento e que sua ausência pode ser
considerada como a principal causa para o declínio da Cooperativa. Apontaram que o
atual presidente começou bem a gestão, mas que as dificuldades foram se tornando cada
vez mais aparentes e que não acreditam na recuperação da COAPIL.
Os trabalhadores entrevistados confirmaram a realização de reuniões,
possivelmente com periodicidade anual, para o repasse de informações para os
membros. Nesse aspecto, consideraram que a gestão da Cooperativa era democrática,
muito embora, também confirmaram que as decisões eram de exclusiva competência da
Diretoria, especialmente, dos presidentes.
É interessante observar que, tanto sócios quanto os trabalhadores entrevistados,
associaram uma gestão democrática a simples divulgação dos resultados alcançados pela
Cooperativa, evidenciando-se que o empreendimento era realmente orientado para a
obtenção de resultados econômicos. Não sendo identificadas ações da COAPIL para a
promoção das capacidades dos sócios e/ou trabalhadores, nem tampouco a instituição
de canais de fomento à participação.
Segundo os trabalhadores entrevistados, a influência política de apenas uma
liderança foi marcante para o período de sucesso da COAPIL, verificando-se que parte
dos entrevistados considerou a entrada no empreendimento como uma espécie de
“favor” prestado pelo político, depreendendo-se que esse entendimento se tornou uma
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fonte de numerosos votos e, consequentemente, contribuindo para a sustentação da
posição política.
Na mesma linha de argumentação dos sócios, também os trabalhadores
entrevistados indicaram que os benefícios econômicos mais importantes gerados pela
COAPIL foram os empregos e o crescimento do ramo comercial na cidade de Itaú/RN.
Considerações finais
Todos os sócios e trabalhadores entrevistados salientaram a importância da
COAPIL na geração de empregos, constituindo, por muito tempo, como a principal
geradora de postos de trabalho no município. Ademais, os pesquisados informaram que
eram tantos os empregos gerados na fase de beneficiamento que pessoas de municípios
vizinhos acabavam se mudando para a cidade a fim de conseguirem uma ocupação.
A partir dos dados e informações coletadas entre os sócios e trabalhadores
entrevistados da Cooperativa e no levantamento documental, pode-se dizer que o
empreendimento alcançou resultados positivos em alguns aspectos: 1) a geração de
postos de trabalho diretos e indiretos, tanto nas propriedades rurais, como nas
atividades agroindustriais da COAPIL; 2) a expansão da cajucultura nos municípios do
entorno, com o aproveitamento do pseudofruto para fabricação do suco de caju e de
ração; 3) a manutenção de preços mais favoráveis para os produtores e o crescimento
das rendas provenientes da atividade agropecuária para os sócios e trabalhadores; 4) os
melhoramentos da infraestrutura nas propriedades rurais dos sócios, principalmente,
através do uso dos tratores da COAPIL; 5) facilitação para sócios obterem
financiamentos bancários; 6) abrangência regional, exercendo influência econômica nos
municípios do entorno de Itaú/RN e; 7) potenciou a economia local, principalmente o
segmento comercial.
E como pontos negativos, pode-se destacar: 1) a dependência elevada em relação
ao comando da Cooperativa, evidenciando-se pela percepção de que o êxito do
empreendimento dependia da atuação de um ex-presidente, como também, o declínio
passou a ser relacionado à figura do atual presidente; 2) a influência política exercida por
uma liderança, cujo poder político acumulado no exercício de vários mandatos como
prefeito do município se intercalou com o comando da COAPIL; 3) a escassa atuação da
Cooperativa para a criação de um ambiente mais participativo e que pudesse criar e
afirmar laços de confiança e colaboração entre os cooperativados; 4) o foco
eminentemente economicista, não viabilizando instrumentos para o aprimoramento
educacional dos cooperativados, nem para a difusão de conhecimentos relacionados à
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prática produtiva entre os sócios (foco na cajucultura de sequeiro); 5) gestão e processo
decisório centralizado (Presidência e Diretoria); 6) carência na formação de lideranças,
evidenciando-se pelo longo tempo em que o atual presidente ocupa a posição (mais de 25
anos) e; 7) incapacidade em reunir os cajucultores associados para tentar o resgate da
Cooperativa.
Por fim, é possível pontuar, com base nas entrevistas realizadas e no
levantamento documental, que a COAPIL foi importante para a geração de emprego e de
renda para o município de Itaú/RN, servindo como atrativo de mão de obra do entorno.
Nesse aspecto, contribuiu para o enfrentamento da pobreza e potenciou a economia
local, com destaque para a atividade comercial. Por outro lado, mostrou-se incapaz de
promover alterações substanciais na estrutura socioeconômica. Na verdade, tornou-se
um instrumento para a manutenção do poder político e para reafirmação das
diferenciações sociais.
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