Faces da História
, Assis/SP, v.6, nº2, p.459-477, jul./dez., 2019
A CVRC produziu uma nota, alegando que o desmatamento dentro de sua
propriedade estava em conformidade com o estabelecido pelo Código Florestal Brasileiro
e também com o projeto aprovado pela SUDAM que previa o desmatamento de até 50%
(70 mil hectares) da área total da CVRC:
A Companhia Vale do Rio Cristalino vem cumprindo rigorosamente o Código
Florestal e o cronograma de implantação de seu projeto agropecuário, aprovado
pela Sudam em dezembro de 1974, cujo Conselho Deliberativo participam, entre
outros representantes do Ministério da Agricultura e do IBDF. Por essa razão,
não há fundamento para as notícias sobre a multa do IBDF ou qualquer outro
órgão que atua na região. Nos termos do Código Florestal, a empresa utilizará
apenas 50% da área da fazenda – 70 mil hectares – para formação de
pastagens. A outra metade será preservada com a sua cobertura natural,
mantendo-se a floresta intacta, de preferência nas regiões montanhosas mais
sujeitas à erosão e junto às nascentes dos rios. Além desse respeito à exigência
legal, ditada pela preocupação de manter o equilíbrio ecológico da fauna e flora
amazônica, a preservação da mata obviamente obedece a fundamentos
econômicos, vinculados ao interesse governamental de desenvolvimento da
região. Na derrubada, são poupadas todas as espécies nobres, como o pau-
brasil, jatobá, massaranduba, cedro, ipê, garapa e outras, que poderão vir a ser
utilizadas mais tarde nas edificações da fazenda e mesmo num futuro projeto de
industrialização e comercialização da madeira. Queimadas são, apenas, plantas,
sem valor comercial, junto com os arbustos e a vegetação parasita (FOLHA DE
S.PAULO, 30. jun. 1976, p. 7).
Além de rechaçar a ilegalidade da prática, fica evidente na nota da CVRC que a
companhia estava disposta a utilizar todos 70 mil hectares previstos no projeto aprovado
pela SUDAM, deixando subtendido a previsão de novas ações de desmatamento.
Ademais, a CVRC defendeu suas ações de desmatamento vinculando-as aos
interesses governamentais de desenvolvimento da região amazônica. A nota da CVRC
expressou, de certa maneira, o ethos do modelo desenvolvimentista proposto pelos
militares para a Amazônia, pautado, em larga medida, em um processo de acumulação
primitiva de capital.
Ainda no ano de 1976 surgiram as primeiras denúncias quanto às condições de
trabalho na fazenda da Volks:
Os lavradores, Natal Viana e Antônio Nunes Cabral, foram à Delegacia Regional
do Trabalho para formular queixas contra os responsáveis pelas fazendas Vale
do Cristalino e Sussuapara, depois de terem viajado de “carona”, pois
trabalhavam há 11 meses sem receber dinheiro: tudo o que comem e bebem é
debitado, sobrando apenas dívidas no fim do mês (FOLHA DE S.PAULO, 08.
maio. 1976, p. 8).
Em 1983 eclodiram novas denúncias por intermédio de um grupo de trabalhadores
apoiados pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). Essas denúncias apresentaram práticas
de cativeiro, ameaça e violência, bem como as mentiras sobre as futuras condições de