FACES DA HISTÓRIA
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Apresentação
Dossiê impressos periódicos: debates e perspectivas
O lançamento de uma revista é sempre um acontecimento auspicioso, tendo em vista a
relevância assumida por esse tipo de veículo na divulgação dos resultados das pesquisas
concluídas ou em curso. Faces da História apresenta-se com importante particularidade, pois se
trata de publicação concebida e organizada sob a responsabilidade dos alunos de mestrado e
doutorado em História, do curso de Pós-graduação da Unesp, campus de Assis. Retomam-se
assim os fios da tradição instituída pela revista Pós-História, que circulou entre 1993 e 2006 e
somou catorze números.
Atualmente, o Qualis da Capes determina, de maneira bem explícita, os quesitos
mínimos para que uma publicação seja considerada científica, o que inclui editor responsável,
conselho editorial e consultivo, com a devida afiliação institucional, ISSN, linha editorial
explícita, normas de submissão, avaliação por pares, mínimo de catorze artigos para as de
periodicidade anual, resumos e descritores em duas línguas, data de recebimento e aceitação
de cada artigo, além do cumprimento rigoroso da regularidade das datas de publicação. Para a
atribuição da qualificação em extratos, a esses critérios obrigatórios somam-se as indexações
em bases de dados e o pertencimento a portais, o aporte financeiro de agências de fomento, a
ausência de endogenia, a composição dos conselhos, frequência de publicação (anual,
semestral quadrimestral), ao lado da necessária qualidade do que se estampa nas páginas
em outros termos, o reconhecimento da publicação pelos pares.
A simples enumeração bem evidencia que a fatura de uma revista acadêmica não é
tarefa simples e o domínio de suas etapas, bem como o esforço em colocar-se nos extratos
superiores, requer um saber específico e de grande valia para os profissionais da área, razão
pela qual deve ser saudada a disposição dos alunos de assumirem tal empreitada.
O dossiê desse número inaugural é dedicado aos impressos periódicos, tipo de
documentação que ocupa lugar de destaque nos trabalhos historiográficos contemporâneos,
que elegem temáticas e orientações metodológicas diversificadas, aliás, como se verifica nos
oito artigos aqui reunidos.
Para começar, a contribuição de Mauro César Silveira que, em perspectiva comparativa,
analisa a imprensa no Cone Sul. Passa em revista aspectos da trajetória dos jornais na região
com destaque para o grupo argentino Clarín, além de deter-se nos estudos recentes sobre os
Tania Regina de Luca
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jornais e revistas levados a cabo nesses países, com seu novo rol de indagações e sugestões
de abordagem.
O Rio de Janeiro do século XIX e suas revistas humorísticas são objeto de reflexão de
Renan Rivaben Pereira, que fornece um panorama das principais publicações lançadas a partir
de 1850, seus responsáveis, objetivos e fontes de inspiração. O autor detém-se de forma mais
pormenorizada nos projetos de Henrique Fleiuss e Angelo Agostini, evidenciando as
possibilidades analíticas e os debates suscitados pela Semana Ilustrada e Revista da Semana.
Camila Soares López, por sua vez, apresenta a fervilhante vida intelectual da Paris de fins do
século XIX que se tem a oportunidade de adentrar por meio do Mercure de France, periódico de
destaque no cenário francês e a partir do qual se acompanham os debates literários e culturais
daquele tempo.
No que respeita às questões de gênero, não restam dúvidas quanto à importância dos
periódicos para revelar valores, hábitos e prescrições que cercavam as mulheres, como bem
evidencia o artigo de Tânia Regina Zimmermann e Ana Carolina Oliveira Carlos, que retoma o
jornal A Cruz, em circulação em Cuiabá entre os anos 1910 e 1915. O título do periódico
explicita sua a vinculação com a Igreja Católica, cuja intenção era a de definir papéis bem
claros e distintos para homens e mulheres, confinando às últimas ao espaço doméstico e às
obrigações para com os filhos, o marido e o lar, tal como se observa no exemplo estudado.
A imprensa periódica é um produto híbrido, de caráter transnacional cujos modelos e
gêneros circulam para além das fronteiras nacionais, aspecto patente nos artigos citados,
mas que se assume o centro da cena no texto de Flavio Ribeiro Francisco. Este trata das
apropriações entre o jornal da imprensa negra paulista Clarim da alvorada (1924-1926) e o
norte-americano Negro World, que divulgava as atividades políticas do líder radical negro
Marcus Garvey, o que acabou por alterar a linha editorial inicialmente adotada e reservar outro
lugar à África.
Em contexto e registro diversos, é também a questão da linha política adotada na
contribuição de Raquel Oliveira Silva, cujo tema é o posicionamento da imprensa baiana
durante a Segunda Guerra Mundial frente ao tenso desenrolar dos acontecimentos daqueles
anos, registrado nos jornais do estado. Se, antes de 1942, era possível a circulação de um
periódico simpático aos regimes totalitários, a exemplo do que se observava no Rio de Janeiro
com o diário Meio Dia, de Joaquim Inojosa, a situação alterou-se em 1942, com a entrada para
a ordem do dia do esforço de guerra e a presença marcante dos EUA e sua política da Boa
Vizinhança, como se observa no exemplo apresentado.
Apresentação
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É também o contexto político que pode impor a decisão de abandonar o país de
nascimento e partir em busca de refúgio, a exemplo do ocorrido por conta dos regimes de
exceção que assolaram a América Latina no século passado, que resultou numa efetiva
diáspora. O artigo de Raphael Coelho Neto e Thiago Henrique O. Prates analisa duas revistas:
Araucaria de Chile (1978-1990), fundada em Paris por exilados do regime de Pinochet, e
Encuentro de la Cultura Cubana (1996-2006), com sede em Madri, criada por um polêmico
dissidente do regime. Espaços de agregação e de debates de ideias, essas publicações
resultam do engajamento em prol da alteração da ordem vigente.
Os primeiros anos da revista Annales são objeto de análise de Andrew Lima, que retoma
o percurso dos fundadores, Lucien Febvre e Marc Bloch, mas também Paul Leuilliot, nem
sempre devidamente mencionado. O autor acompanha a publicação, tão simbólica para os
historiadores, até o início da direção de Fernand Braudel.
O dossiê encerra-se com a entrevista de Marie-Éve Thérenty, renomada estudiosa das
relações entre literatura e imprensa, professora da Universidade de Montpellier III, que tem a
oportunidade de discutir sua trajetória intelectual e os seus temas de pesquisa.
Assis, 22 de junho de 2014.
Tania Regina de Luca Unesp/CNPq