HOBSBAWM, Eric. Tempos Fraturados: cultura e sociedade no século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 2013. 358 p.
FACES DA HISTÓRIA, Assis-SP, v.1, nº1, p. 225-231, jan.-jun., 2014.
Construindo sua narrativa com o rigor e a estética que marcaram sua erudição ao
longo das décadas, deve-se dizer, inicialmente, que os quatro eixos centrais da obra
possuem íntimas relações temáticas. São afins e se complementam, pois são atravessadas
por dois fios condutores que são a questão do desenvolvimento capitalista e a constituição
da cultura burguesa na sociedade ocidental. Desse modo, amarradas por esses eixos
condutores, a obra foi capaz de abarcar uma diversidade de questões e assuntos.
Tratando e entrelaçando temas políticos, sociais e/ou culturais que vão do século XIX
ao XXI, nota-se que Hobsbawm, mantendo-se fiel a sua interpretação marxista, considera
que a premissa do livro se insere na crítica ao paradigma capitalista, já que acredita que o
desenvolvimento do capitalismo, como a própria lógica da civilização burguesa, estavam
destinados a destruir seus alicerces. Por consequência, é nesse aspecto, por exemplo, que
se inserem as análises de “tempos fraturados” sobre o rumo das manifestações das artes,
ou, ainda, da tecnologia e da ciência.
Nesse campo prognóstico do estudo das artes, Hobsbawm afirma que, na falta de
profetas profissionais, o historiador, que é o especialista do passado, pode se aventurar pelo
campo da futurologia, porque o passado, o presente e o futuro formam um continuum
absoluto (2013, p. 27). Ressaltando que o historiador estaria apto a se posicionar sobre o
futuro, Hobsbawm abre margem para críticas, pois entra numa seara delicada para os
historiadores, que estão convencionados, em grande medida, a examinar o passado e não o
futuro. Vale ressaltar, aliás, que a ideia de futuro ou de porvir são características centrais da
obra. Tratando principalmente das artes e da ciência, Hobsbawm dialoga com as
possibilidades e incertezas do amanhã.
Notando que as artes, atualmente, mantêm uma dependência com a revolução
tecnológica, o intelectual defende que o progresso da computação não acabará com o livro,
bem como o cinema, o rádio, a televisão e outras inovações tecnológicas não o fizeram.
Quanto à música, Hobsbawm se resume a dizer que vivemos num mundo saturado dela. Os
sons nos acompanham por toda a parte. Para ele, “A sociedade de consumo parece achar
que silêncio é crime” (2013, p. 32). Elaborando, em última instância, uma crítica contra com
a revolução tecnológica e a sociedade de consumo, o autor considera que os próprios
conceitos tradicionais de arte e cultura estão se tornando obsoletos.
À medida que trata de temas candentes da sociedade contemporânea, Hobsbawm
vai justificando a ideia de tempos fraturados. Investigando um panorama amplo como, por
exemplo, as consequências da alta mobilidade das pessoas (viagens, turismo, imigrações)
para a cultura no mundo globalizado, o intelectual verifica a possibilidade de
enfraquecimento das culturas hegemônicas. Dialogando com o multiculturalismo, o autor vai
destacar a internacionalização de muitos aspectos culturais, como a culinária ou o futebol.