ALMEIDA, Leandro Antonio
*
https://orcid.org/0000-0001-8354-9514
RESUMO: O objetivo deste trabalho é analisar a
sátira cômica do autor João de Minas em suas
obras de ficção publicadas em meados dos anos
1930. Nos anos 1920, a sátira de seus textos está
direcionada contra os adversários do governo
Washington Luís, ao qual o escritor se alinha
politicamente. Na década seguinte, após o
movimento de outubro de 1930 e a ascensão de
Getúlio Vargas, se direciona aos novos donos do
poder. Porém, o autor amplia o alvo da sátira
para toda a sociedade brasileira. Nos textos
sertanistas e nos romances urbanos publicados
em 1934, notamos a representação de um mundo
ficcional no qual as protagonistas e poucos
personagens bondosos são rodeados por
pessoas corruptas, ambiciosas, interesseiras e
taradas. Tomamos como fio condutor o
tratamento ficcional de eventos da história
recente do país nos anos 1930, através dos quais
mostramos como o autor João de Minas se
distancia, pela sátira, dos discursos eufóricos de
legitimação da nova política e da nova sociedade,
alinhando-se a uma tradição humorística
brasileira que vem dos primeiros tempos da
República.
PALAVRAS-CHAVE: Golpe de 1930; João de
Minas; sátira; romance sexual; romance
sertanista.
ABSTRACT: The main goal of this paper is to
analyze the comic satire of the author João de
Minas in his works of fiction published in middle
1930s. In the 1920s, the satire of his texts is
directed against the opponents of Washington
Luís’s government, to whom João de Minas aligns
politically. In the next decade, after the
movement of October 1930 and the rise of
Getúlio Vargas, it was directed against the new
ruling politicians. However, the writer expands
the satire's target to the entire Brazilian society.
In wilderness texts and in the urban novels
published in 1934, we notice the representation
of a fictional world in which the protagonists and
a few kind characters are surrounded by corrupt,
ambitious, self-interested and perverted people.
We take as a guiding thread the fictional
treatment of the country’s recent historical
events in the 1930s, through which we show how
the author João de Minas dissents, by satire,
from the legitimation euphoric speeches of the
new policy and the new society, in line with a
Brazilian humorous tradition that comes from
the early days of the Brazilian Republic.
KEYWORDS: 1930s Coup; João de Minas; satire;
sexual novel; wilderness roman.
Recebido em: 21/07/2020
Aprovado em: 07/11/2020
* Doutor em História Social (USP), professor do curso de licenciatura em História do Centro de Artes,
Humanidades e Letras da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia, Cachoeira-BA. E-mail:
leandroaalmeida@hotmail.com. Este artigo decorre da nossa tese de doutorado “As mil faces de João de
Minas: a construção do escritor e a repercussão de seus livros no campo literário brasileiro (1927-1989)”.
Foi defendida em 2013 no programa de História Social da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
Humanas da Universidade de São Paulo.
Este é um artigo de acesso livre distribuído sob licença dos termos da Creative Commons Attribution License.
O objetivo deste trabalho é analisar a sátira mica nas narrativas ficcionais do
autor João de Minas, pseudônimo do escritor Ariosto Palombo (1896-1984)
1
, nos anos
1930. Esse hoje desconhecido escritor procurou se inserir no mercado de ficção massiva
em expansão no país na primeira metade dessa década, e seus livros tinham enredos
marcados pela sátira à política e à sociedade. Logo, longe de apenas propiciar diversão
através da narrativa a um grande número de pessoas, o texto ficcional era também uma
forma de intervenção nas discussões sobre os rumos do país no período. O que não
significa, como veremos, que a ficção do autor João de Minas se reduza às perspectivas
do escritor Ariosto Palombo.
Partindo da História Cultural do Humor, pretendemos situar o papel da
comicidade na constituição de uma cultura e literatura de massas no Brasil, tendo como
foco como ela representou processos políticos e sociais em um determinado momento
histórico. Analisaremos especificamente a sátira, caracterizada pela mobilização dos
recursos cômicos de uma obra, no todo ou em partes, qualquer que seja a linguagem,
como uma arma contra alvos, que podem ser amplos, como sociedades e grupos, ou
específicos, como pessoas, visando a uma audiência com a qual compartilha (ou espera
compartilhar) valores e perspectivas. Nesse sentido, a sátira pressupõe um
distanciamento em relação aos alvos e um padrão moral implícito, não necessariamente
aquele vigente em determinada sociedade como um todo ou em seus grupos. Logo, ela
pode estar a serviço da correção e manutenção dos padrões morais e práticas existentes
(ridendo castigat mores) ou visar sua destruição, levando de roldão seus alvos, e, se for
além da invectiva, implicará a constituição de novos valores e práticas, presentes em
outros lugares ou projetados para o futuro
2
.
Para tratar o problema em relação ao nosso objeto, no próximo item vamos
apresentar o posicionamento do escritor Ariosto Palombo frente às discussões políticas,
sociais e culturais da primeira metade dos anos 1930. Depois, ao analisarmos sua ficção,
1
Apesar de Ariosto Palombo ser referido como João de Minas entre intelectuais e jornalistas, a ponto de o
próprio assinar pelo pseudônimo suas obras, neste trabalho, daqui por diante, usaremos Ariosto Palombo
quando nos referimos ao escritor, seus aspectos biográficos e sociais, e João de Minas ao autor, instância
configuradora de um texto de crônica ou ficção. Para a biografia de Palombo, ver ALMEIDA, 2008, cap. 1.
2
Aqui nos valemos das perspectivas de BERGER (1998) e FRYE (1973) sobre a sátira. Para BERGER (1998,
p. 255), que busca mapear as diversas formas de expressão do cômico na vida e na arte, no sentido mais
restrito a sátira pode ser definida como “el uso de lo cómico en un ataque que forma parte de un programa
del que la esgrime. Dicho de otro modo, en la sátira, la intención agressiva se convierte en motivo central
de la expresión cómica. Todos los elementos de lo cómico se funden entonces, en cierto modo, para
constituir un arma.”. Levamos em conta também as contribuições mais recentes de CONDREN (2012 e
2014) e GILMORE (2018). Ambos apontam as dificuldades de definição que abranja o fenômeno numa
categoria ampla, e de definir literariamente como um gênero, apontando o caráter múltiplo e
historicamente determinado da sátira. Sobre a sátira a partir da História Cultural do Humor no Brasil, ver a
análise das crônicas Lima Barreto feita por SALIBA (2018), na qual liga a questão da sátira ao
distanciamento.
tomaremos como fio condutor a representação dos eventos da então história recente do
país em cada obra, focalizando o modo e as partes em que eles são configurados para
gerar efeitos micos. Tal análise será feita em dois momentos. Abordaremos
primeiramente dois livros sertanistas do autor, buscando mostrar as mudanças da
representação do mundo sertanejo governado pelos coronéis, da posição do narrador e
do alvo da sátira entre fins dos anos 1920 e meados dos anos 1930. Depois, mostraremos
como as linhas de força presentes nessa ficção sertaneja dos anos 1930 aparecem
ampliadas nos três romances sexuais urbanos publicados em 1934, então focados nas
agruras das protagonistas contra o mundo corrompido que as cerca.
Depois, Miseravelmente Depois, para onde vai o Brasil?
O sucesso do movimento de outubro de 1930, empreendido pelos grupos ligados a
Getúlio Vargas, e a instauração de uma nova ordem político-institucional a nível federal e
estadual, afetaram as discussões sobre um tema caro ao país desde os anos 1920, a
revolução, reconfigurada pelo novo sentido difundido pelos agentes à frente do Estado
(DE DECCA, 1981, p. 71-107; VESENTINI, 1997). Nos anos iniciais de 1930, ele vinha
acompanhado e dava o tom à utilização de outros termos recorrentes nas fontes do
período, como oligarquia/burguesia, República Velha / República Nova, Primeira
República / Segunda República, movimento de outubro / Revolução de 30, Revolução
Constitucionalista / Contra-Revolução, Governo Provisório / Ditadura, Tenentes /
Tenentismo, politicalha / ciência / sociologia. Esses pares conceituais não são neutros,
mas revelam posturas polarizadas em debate: por um lado, justificando e legitimando o
novo regime ou, por outro, mostrando a oposição feita pelos grupos por ela deslocados,
principalmente os situados em São Paulo (BORGES, 2001, p. 161-165; COHEN, 1997).
Essas não eram posturas absolutas, pois “entre esses dois extremos oscilaram as
diferentes propostas de reordenamento social, tendo como preocupação fundamental a
definição de ‘rumos’ para a sociedade brasileira, tomando como modelos as experiências
políticas dos países da Europa Ocidental.” (COHEN, 1997, p. 104). O caráter recente do
regime e sua legitimação pela ideia do “novo” (BORGES, 2001, p. 163) levava a uma
pluralidade de posições políticas e projetos para o país.
Em torno do debate lançou-se uma torrente de livros tentando apreender os
sentidos da revolução, dos temas e problemas que levantou e das possíveis soluções
para o Brasil (OLIVEIRA, 1980). Saiu em 1933 uma obra tão expressiva do momento que
revelava no título a diversidade do ambiente político brasileiro: Para onde vai o Brasil?
Para o comunismo? o fascismo? o integralismo? a democracia? o socialismo? o
federalismo? a ditadura? (PARA..., 1933). A obra reúne respostas a um inquérito
realizado pelo Diário de Notícias junto a intelectuais, aos quais foi perguntado “Para
onde vai o Brasil?” O título não mostra que muitos se recusaram a responder à pergunta
ou diziam claramente que a nação não iria a lugar algum, posturas reveladoras de uma
pluralidade de posições definidas e também do desnorteamento, instabilidade e
insegurança, percebido no prefácio de Gilberto Amado:
Para onde vai o Brasil? Difícil chegar à conclusão pelas respostas que nos
deram. O que podemos ver é o que vemos no mundo inteiro um tremer de
asas indecisas (...) Bem embaraçoso seria, porém, colher das diversas respostas
uma orientação clara ou diversas orientações nítidas. A confusão do nosso
tempo neles se reflete. (PARA..., 1933, p. 6).
Uma das posições céticas em relação à história recente e aos destinos do país foi
concretizada na pena de Ariosto Palombo, especialmente em uma intensa e bem-
humorada crônica que poderia figurar no livro Para onde vae o Brasil? por conta do seu
tom de balanço dos processos políticos e sociais mais amplos, bem como os impactos
deles na vida do escritor. Escrita em meados de 1934 sob o título Depois,
Miseravelmente Depois, foi publicada em um de seus livros sertanejos que continha
contos requentados sobre a Coluna Prestes. Valendo-se de sua própria trajetória, o
cronista reflete sobre o que ocorreu entre o então “longínquo” ano de 1925, quando teria
presenciado a entrada da Coluna Prestes no município goiano de Rio Bonito, episódio
que descreveu no seu “mais famoso livro” Jantando um Defunto; e o seu presente,
sentado à noite num banco do vale do Anhangabaú, em São Paulo, contemplando o
edifício Martinelli, símbolo arquitetônico da modernidade brasileira. O primeiro nível de
sua reflexão é a mudança de posições e alianças políticas com o movimento de outubro,
tomando como alvo Juarez Távora. Segundo Ariosto Palombo, em 1925, o líder tenentista
integrava o estado maior de Prestes; em 1934, era Ministro da Agricultura do governo
Vargas, realizando conchavos com seus antigos inimigos Antonio Carlos e Benedito
Valadares para se manter no cargo. Isso levou o cronista a se lembrar de supostas
palavras de Prestes: “Si o Antonio Carlos lhe der uma promoção no Exército, este Juarez
nos vende...” (MINAS, 1934a, p. 191).
Junto dessas mudanças sujeitas ao caráter dos indivíduos e sua adequação
consciente às conveniências do momento, há outra indagação sobre a mudança das
estruturas políticas. O questionamento gira em torno das condições da situação das
principais personagens dos antigos grupos dominantes, amigos do escritor. O efeito
cômico se pelo contraste entre sua elevada posição social e política passada com a
desfavorável situação presente:
Como tudo mudou, ou bolou as trocas!... Aquele pudico Arthur Bernardes, que
nesse ano remoto de 1925 era como que um deus (...) anda agora vagando pela
Europa, sem chapéu, arrasado, de botas cambadas e colarinho sujo... Assim o
meu inseparável amigo Dr. Washington Luís. Assim uma porção deles... Como se
pode explicar tão elétrica, repentina reviravolta?... Não se sabe. (MINAS, 1934a,
p. 189 e 202).
Passados quatro anos do acontecimento, o cronista ainda se perguntava,
incomodamente, sem conseguir respostas que o satisfizessem plenamente, sobre o que
teria levado a “sólida” política brasileira da República Velha a se desmanchar. Uma
explicação é esboçada na seguinte reflexão sobre a condição histórica dos novos donos
do poder:
Os Medeiros Netos, os João Beraldo, e outros que tais querem por toda lei fazer
o probo dr. Getúlio Vargas de peão, e montá-lo no burro doido que é o povo, por
mais quatro anos. O sedutor dr. Getúlio Vargas (com toda a sua récua de
interventores estaduais) vai e monta no diabo do burro popular. Aos dispois
como diz o meu cumpade Balarmino o burro ouve cheiro de chamusco, ou
de porva queimada. E empina, e arruma no chão os cavaleiros, esborrachando-
os na lama da estrada da História do Brasil!... Será pissi-i-i-i-ive, gentes?... É
possível, sim, e muito possível o burro brabo dar com o traseiro redondo de
todos esses ilustres cavaleiros no chão. E aosdispois sempre como diz o
disgramado do meu cumpade Balarmino a fulia vira arrelia... E recomeça a
história. Serão os atuais moços bonitos discricionários que passarão a vagar
pela Europa, descalços, sem chapéu, sofrivelmente bichentos... (Isso mais porém
bice-bersa-u-cuntrario que os parta se os granadeiros o permitir, porque pode
muito bem haver um churrasco de cabeças cortadas, com molho de sargentos
em azeite dendê do bão...). (MINAS, 1934a, p. 191).
Assim, através da tentativa cômica de simular uma linguagem oral interiorana, a
fala de alguém que estaria fora do circuito da luta pelo poder, vemos sintetizado como
Ariosto Palombo viu o processo “revolucionário”: um movimento militar que, incitando a
instabilidade do povo brasileiro (significativa e ambiguamente comparado a um burro
bravo), teria deposto os antigos governantes (descritos de forma calamitosa) e
estabelecido um novo regime. Essa leitura do passado recente partia da percepção
peculiar de uma situação política presente: o povo estaria pronto para, na menos trágica
das possibilidades, jogar na “lama da estrada da História do Brasil” aquelas novas
personagens como Getúlio Vargas e seus interventores, assim como fez com os antigos
governantes Washington Luís e Arthur Bernardes. Na possibilidade mais trágica, a
imagem do churrasco revela a percepção de terror que poderia advir, projetado pelo
autor com base na vivência que teve de 1930, ao fugir do país em função do governo que
se instaurava. Nesse trecho, são abordados dois dos temas muito caros a esse debate
sobre outubro de 30: o clima de instabilidade política e o alcance popular do movimento.
Representa-se uma visão negativa de ambos, seja da ignorância do povo ou do perigo
que a instabilidade pode ocasionar. Assim, uma percepção cíclica da história a partir
de uma conjuntura política instável.
Num terceiro vel, para o cronista, essa mudança política teria reverberado
noutros setores da sociedade. O tom é de extrema perplexidade melancólica: “Os anos
passaram. Tudo mudou, no terremoto japonês que nos virou de catrâmbias. Outro
mundo, outro espírito, outra cultura, e até outra geração.” Fundada numa equação
tradicional que tende a associar Estado Sociedade História, concebendo os atores e
eventos políticos como os principais sujeitos das transformações históricas, a mudança
de 1930 é percebida não apenas de maneira restrita, mas como um marco de mudanças
estruturais para toda a sociedade brasileira, em todas as suas dimensões, capaz de influir
na vida de todos. Aquilo que o escritor Ariosto Palombo sente como uma mudança
generalizada, catalisada por um evento político, também teria causado impacto direto no
seu próprio destino: se perguntado em 1925 sobre como seria o seu futuro, responderia
com toda a convicção “Em 1934 eu serei no mínimo senador da República, e... milionário,
ainda por cima!”. Todavia, o “terremoto japonês” não o tornou miliorio nem senador;
pelo contrário, o teria colocado na mesma condição dos seus ilustres amigos, não num
exílio geográfico no exterior, mas um exílio histórico na própria São Paulo: “Saí de casa,
depois do jantar. Fui andando, apagado, como um fantasma de um outro tempo, de uma
idade morta... Fui andando.” (MINAS, 1934a, p. 191 e 199)
A sensação de deslocamento que permeou essa interpretação estava ligada à
instável trajetória de Ariosto Palombo nos quatro anos anteriores, que acompanhava a
situação política geral. Tendo militado pelo PRP, entre 1927 e 1930, seu apadrinhamento
político o levou a colaborar em diversos periódicos governistas, a ter seus livros editados
pelo jornal O Paiz e a quase ser alçado a deputado na eleição de março de 1930. Tais
perspectivas desmoronaram depois de outubro, que levou o escritor a servir a diversos
grupos políticos conforme a conveniência, com postura não muito diferente da de Juarez
Távora: mesmo tendo que fugir para a Argentina, chegou a esboçar uma laudatória
biografia Getúlio Vargas e João Pessoa em fins de 1930 e 1931, em 1932 estava atuando
em prol dos Constitucionalistas paulistas, em 1933 trabalhou para o Governo Federal a
serviço do interventor Waldomiro de Lima em São Paulo, e em 1934 fez campanha em
prol da candidatura de Armando Salles.
Porém, nesse mesmo ano de 1934, diversificou sua atividade lançando-se à esfera
cultural, dirigindo revistas ilustradas, escrevendo crônicas mundanas e, principalmente,
publicando uma série de romances voltados a captar o interesse do público leitor em
expansão, nos gêneros mais vendidos pelas editoras do período como aventuras
sertanistas, sentimentais e policiais (ALMEIDA, 2012, cap. 3; MICELI, 2001). O escritor
mineiro publicou em 1934 Horrores e Mistérios nos Sertões Desconhecidos, Pelas Terras
Perdidas, A Mulher Carioca aos 22 Anos, A Datilógrafa Loura, Uma Mulher... Mulher!,
contos policiais que ilustraram as capas de O Malho e iniciou o folhetim policial Nos
Misteriosos Subterrâneos de São Paulo (reunido em livro em 1936). Tais publicações se
ligaram a uma pretensiosa guinada literária, cujos termos o autor bem expressou em
duas ocasiões. Na resposta a um crítico, em 1935, comentou a respeito do público-alvo:
Os livros brasileiros até pouco sofriam uma bruta concorrência dos ditos
estrangeiros, por isto: o nosso livro não tinha o que se ler, no sentido fácil e
popular; fazíamos muito estilo, discutíamos escolas literárias, brigávamos,
perdidos no fundo de gmios, academiazinhas, fundações, num sifilítico
babuzar de elogio mútuo... Ora, o povo ou as classes não querem saber
disso. Eu fugi desse caminho burro. Resolvi fundar o romance popular no Brasil.
E tenho pena dos rapazes mentecaptos e importantes, aqueles!... (MINAS, 1935,
p. 5).
Ariosto Palombo comentou o teor de tais livros no paratexto de um desses
romances:
Creio que os meus livros, principalmente os meus romances (Revolução Sexual
Brasileira), devassam um mundo novo à mocidade, aos rapazes e às moças que
rolam para um futuro absolutamente imprevisto, e que os velhos caturras de
hoje não podem sequer sonhar... Eu escrevo para os moços, e espero uma
revolução social que de um momento para o outro vire o mundo de pernas para
o ar... (MINAS, 1934c, p. 201).
As citações acima apresentam a mesma percepção da crônica Depois,
Miseravelmente Depois, uma discussão sobre mudanças históricas no país. Aqui, porém,
o tom de ceticismo, de reprodução indefinida do presente e a sensação de deslocamento
dão lugar a certo otimismo missionário. O escritor visa grupos emergentes de leitores
como os jovens, as classes médias e populares, os quais, ao longo dessa década, cada vez
mais consomem ficção e aumentam o lucro das grandes e pequenas editoras surgidas no
período, o que parece torná-los capazes de romper o imobilismo da história e abrir o
presente rumo a um futuro diferente por conta dos costumes e valores que trazem. Ao
colocar a questão em termos geracionais, tanto sociais quanto literários, o escritor
apostava em mudanças socioculturais estruturais, das quais se apresenta ou pretende
ser um arauto.
Independentemente de o escritor Ariosto Palombo acreditar ou não nas crônicas e
nos paratextos que escreveu, a consciência de deslocamento histórico veiculado também
aparece representada nas obras ficcionais do autor João de Minas publicadas nesse
profícuo ano. O tom acentuadamente crítico, sem ser programático, pode ser detectado
na maneira como o autor se vale do cômico: ele abandona a invectiva militante contra os
inimigos do regime perrepista, em fins dos anos 1920, para veicular uma ampla sátira
política e social nos livros de 1934, com efeitos paródicos em relação às tendências
literárias do período.
O fim do paraíso sertanejo
Além de um libelo contra a Coluna Prestes, o livro de estreia de Ariosto Palombo,
Jantando um Defunto, mobilizou um tema caro aos intelectuais brasileiros em finais dos
anos 1920, o sertão, os costumes de sua gente, a paisagem, a flora e a fauna. A virada
nacionalista da segunda metade dos anos 1910 levou a uma mudança de olhar para as
regiões do país o ligadas aos grandes centros urbanos. De lugares naturais, incultos e
selvagens, antíteses do progresso, cada vez mais foram valorizadas ao serem associadas
à nacionalidade brasileira (SEVCENKO, 1992). A essência da brasilidade foi buscada por
intelectuais em tais regiões para se contrapor aos elementos estrangeiros valorizados
por parte das elites litorâneas eurocentradas. Os exemplos literários mais conhecidos
ressaltam a guinada modernista rumo ao nacionalismo e a “redescoberta do Brasil” após
1924, seja na vertente Pau-Brasil de Oswald de Andrade, na do Clã do Jabuti de Mário de
Andrade ou no verde-amarelismo de Menotti Del Picchia (MORAES, 1988; SEVCENKO,
1992). Nesse sentido, o escritor Ariosto Palombo, conhecedor da produção dos
intelectuais paulistas, de Monteiro Lobato aos modernistas, seguia um tema da moda.
Procurou se inserir na vertente sertanista ao se representar como jornalista intrépido,
narrador-personagem João de Minas, que viajava por essas regiões naturais e até
intocadas, e as descobria em primeira mão, para deleite dos seus leitores. Em tais
andanças, encontrava os integrantes da Coluna Prestes, em sua passagem por Goiás, e
relatava os efeitos negativos da sua passagem sobre as populações rurais. Foi nesse
contexto discursivo que mobilizou a sátira contra os revoltosos e seus simpatizantes.
A narrativa abaixo, A Pergunta do Morto, foi inicialmente publicada no rodapé da
primeira página do jornal O Paiz cinco meses depois da interiorização da Coluna Prestes
na Bolívia, mais exatamente em 17/07/1927 e, em 1929, integrou o livro Jantando um
Defunto. Aborda um dos mais sangrentos combates entre as forças legalistas contra a
Coluna: a batalha na fazenda Zeca Lopes, em Goiás, em 29 e 30 de junho de 1925. O texto
tem três partes: a chegada dos dois personagens à idílica e farta fazenda, o combate das
tropas de Klinger contra o destacamento da Coluna Prestes, representada com
elementos cômicos, e a irrupção de eventos sobrenaturais uma voz misteriosa de um
soldado morto, ouvida pelos personagens, que pergunta sobre um anel de casado numa
mão decepada
3
. O trecho abaixo é a transição da primeira parte para a segunda:
Tudo dormia. Isso não impediu, todavia, que uma hora depois o fazendeiro, um
grande chefe de todo o sudoeste, mas homem bom e ilustre, nos oferecesse uma
magnifica ceia. Seria meia noite quando evocou o dr. Freire uma forte pagina
trágica da fazenda. Foi um combate terrível, entre 70 soldados mineiros, sob o
comando de Klinger, e um destacamento de Prestes, quando este, em Junho de
1925, voltando de Mato Grosso, por Coxim, entrou em Goiás, por Mineiros, que
foi devidamente saqueado. O combate foi a uma légua da casa da fazenda. Um
capitão revoltoso, ao assaltar um caminhão, recebeu uma descarga. Desceu do
caminhão, e ainda andou até o rego d'água que leva á cozinha da fazenda. Ali os
seus companheiros viram que ele vinha segurando um rolo de intestinos á
mostra. Os intestinos estavam sujos de lama, o que mostra que o herói mais de
uma vez os apanhou no chão, tendo os ditos escorregado, naturalmente. O
capitão ai se agachou, e morreu em silencio. Os seus companheiros, á pressa, o
enterraram na lama do rego, envolto num capote. Por minutos ainda a água do
rego desceu, suja de sangue, excrementos e heroísmo... Aquela água ia, na
coxinha da fazenda, lavar os pratos para o jantar da gente de Klinger, vencedora
no combate. O coronel Zéca Lopes, que se achava na cidade, quando voltou
mandou desenterrar o capitão, cuidadoso da pureza da sua água Enterrou-o
atrás da fazenda. Vi essa sepultura. O dr. Freire olhou-a, muito sério. O capim
começava a cobri-la, um capim cheio e rico. Por ali, numa área de uma légua
quadrada, uns oitenta combatentes dormiam para sempre. Aquilo era um
cemitério, com a vantagem de ser também uma ótima invernada. (MINAS, 1929,
p. 87-89).
O que marca a representação do lugar feita pelo autor João de Minas é a
abundância em torno do fazendeiro: o caráter (sua generosidade, bondade e ilustração),
o tamanho das suas propriedades, a extensão de seu poder político por todo o sudoeste
goiano, a magnífica ceia que oferece. Sintetizada pela expressãotudo dormia”, o silêncio
noturno cria um paralelismo entre a natureza e a sociedade descritas, sugerindo um
mesmo princípio regente de ambas. Este universo fechado é perturbado a primeira vez
pela presença dos viajantes, o narrador-personagem Jo de Minas e médico Freire, que
trazem a marca da modernidade em um automóvel. Na primeira parte, os elementos
modernos integram sem conflitos o mundo idílico. A despeito de possuir uma visão de
mundo diferente daquela dos coronéis, o dr. Freire parecia ter trânsito livre em suas
terras, ciceroneando o narrador. Violentamente, a harmonia da fazenda fora rompida
com a invasão do destacamento da Coluna Prestes, contada pelo médico. A morte do
capitão é tomada como metonímia da luta, como indica a área do enterro coletivo e a
estrutura da narrativa dessa parte: chegada do destacamento, assalto do capitão a um
caminhão e seu alvejamento, agonia, morte e enterro pelos companheiros, novo enterro
pelo coronel.
3
Esta terceira parte da crônica não será objeto da análise, porque nela o estilo cômico lugar ao
fantástico. Para uma análise detalhada da íntegra dessa crônica, inclusive levando em conta elementos
paratextuais do jornal, ver (ALMEIDA, 2012, p. 42-53).
O relato do combate não é feito pelo narrador num tom informativo, mas
assemelha-se aos fait divers da imprensa. Com um grande poder de síntese, a evocação
da “forte página trágica da fazenda” não é contada tragicamente, pois a atmosfera séria e
macabra evocada pela morte é, logo em seguida, suspensa por elementos que a
dissolvem no cômico. A morte do capitão é contada em tom grotesco (“segurando um
rolo de intestinos á mostra...”), e, ao mesmo tempo, com tons irônicos, como em “por
minutos ainda a água do rego desceu, suja de sangue, excrementos e heroísmo...” ou o
cemitério que também era ótima “invernada”, pasto para gado. A impressão é que o
narrador-personagem ri ao pé da cova dos revolucionários, enquanto ironicamente conta
os detalhes sórdidos de sua morte. O procedimento cria uma distância que impede a
simpatia entre a morte dos combatentes e o leitor, já esboçada com o termo revoltosos”
ou com a menção da cidade de Mineiros “devidamente saqueado”.
A invasão sugere a ideia de que os soldados do destacamento teriam maculado tal
espaço. Daí que os legalistas de Klinger os heróis tiveram mérito em defendê-la e,
como prêmio de sua vitória, receberam o jantar na fazenda. Assim, tais recursos cômicos
do trecho estão a serviço de uma posição política, não explicitadas pelas personagens
elas apenas relatam o combate. Esse não posicionamento, que coloca em evidência
apenas o relato, cria um efeito de neutralidade, que reforça a representação positiva do
coronel Zeca Lopes. O potentado aparece como o eixo humano de toda ordem ameaçada,
com harmonia, paz e fartura, sediada numa fazenda idílica e sem conflitos, atravessada
por uma paradisíaca, pujante e arrebatadora paisagem. Ao mesmo tempo, é apresentado
como “homem bom e simples”, qualidades que justificam sua posição de líder regional do
sudoeste goiano, integrante de um sistema de apoios políticos que se inicia no sudoeste
goiano e termina no Catete, na capital federal, Rio de Janeiro.
A representação do legalismo e do coronelismo nos textos do autor na década de
trinta não segue esse padrão dos livros do final da cada de 20. Os coronéis sertanejos
deixam de ser bons, simples e hospitaleiros, tornando-se passionais e cruéis. Esse tema
aparece em “A onça que comia revolucionário gordo”, um dos textos inéditos do livro
Pelas Terras Perdidas, que começa quando o narrador-personagem João de Minas chega
com suas tropas na divisa entre Goiás e Bahia, em domínio do rico chefe político
Sebastião Nunes Alves, assim caracterizado:
Os negros locais, num raio de cem léguas, ainda o chamavam de “capitão do
mato”, o que quer dizer uma autoridade ainda vigorante para fins de caça ao
negro escravo. E isso algumas dezenas de anos depois de abolida no Brasil a
escravidão.
O famoso ricaço daquelas terras perdidas, presidente da caimbra” (câmara),
“meretriz seu juis de pais” (meritíssimo sr. juiz de paz), mas sempre com a avara
de juiz de direito, etc., sabia da minha chegada. E me esperava, de calça branca,
de algodãozinho alvejado e fiado em bilros, como se fazia cem anos atrás;
com o par de botas de cerimônia, palede sarja preta azulada pela velhice, um
lenço de Alcobaça sarapintando no pescoço. (...) Depois do jantar, o potentado
bebeu uma golada de água amarela, meio barrenta naquele começo de seca, e
enfiou um dedo por dentro e ao redor das gengivas, limpando os restos de
comida, e assim higienizando a dentuça. E me falou, com um orgulho natural,
casto, doce, como se aquilo fosse uma tirada jurídica em audiência, uma
motivação de sentença:
- Oie, O seu Luiz Carlos Preste sirvia pra Deus... Esse imprego de Nosso
Sinhô tava bão pra ele. O disgramado do generar in toda parte. Deus é qui é
assim: sempre in toda parte, mêmo qui seja di mintira... Mais eu agora tomei
as minha midida legar, tudo conforme as orde do dotô Artur Bernalde, nosso
chefre supremo. A minha primêra midida legar é a Mimosa. O cabôco aqui
prêsses lado qui num for legalista do ligite, do bâo mêmo de famia, eu aprico
nele a Mimosa. A Mimosa é interada de boa pressas coisa... (MINAS, 1934a, p.
44-5).
Tanto o autor quanto o narrador personagem usam os estratagemas para
caracterizar o ridículo do coronel: o modo de falar, que cria ambiguidades risíveis como a
troca de meritíssimo por meretriz, o hábito à mesa de limpar os dentes com a mão, o
modo antigo de vestir, seu orgulho legalista. A representação, cômica aos olhos dos
leitores urbanos, por ressaltar aspectos de um passado distante, vem acompanhada de
outro aspecto nada moderno: a violência cruel nas mãos de um chefe político local, com
práticas pré-republicanas de caça aos escravos, o uso privado da coisa pública, da lei
para perseguir desafetos, mortos de maneira macabra. No conto, esse papel cabe à
Mimosa, uma onça que “só come rivolucionaro gordo, rivolucionaro puba”, segundo uma
das vítimas, o pequeno fazendeiro José, encarcerado porque se recusou a entregar a
quarta filha para deleite sexual do potentado, querendo ele mesmo usufruir da menina:
“Quê qui tem a gente isprimentá a fia da gente?...”. A sociedade interiorana está longe da
descrita nos textos dos anos 20: não é mais um todo harmônico atingido por um mal
externo, mas grupos com interesses distintos, permeada por violência de todos os lados,
mesmo de pai para filha. Numa sociedade assim, o verniz da lei é mais um instrumento de
dominação e intimidação: um dos pontos cômicos é a pretensão legalista do coronel, a tal
ponto de ele mesmo ditar penas cruéis que não fazem parte do código penal.
Representante da ordem nacional, o narrador repudia tais práticas: “vinha-me um
ódio brutal do cangaceiro que governava aquelas míseras gentes goianas, sob o aplauso
no sul, na remotíssima capital do Estado, dos Caiados, os proprietários da
incomensurável senzala estadual.” O tratamento dado ao prisioneiro seria motivo para o
narrador-personagem “preparar com a minha gente a prisão do cacique facinoroso”. A
ação foi interrompida porque Prestes tomou o povoado, com seus soldados fantasiados
de almas penadas numa procissão. O narrador não é preso porque José, tornado o chefe
político do município em nome da revolução, por ter simpatizado com o narrador-
personagem, impediu que a Coluna atacasse a tropa legalista. O conto termina de modo
grotesco, com a onça “rasgando vorazmente o cadáver ainda quente do chefe caiadista
local”, como se a mudança de poder político fosse compreendida até pelo reino animal,
como aparece nas palavras de José: “Eu madei fazê co ele, o qui ele quiria fazê cumigo.
Mimosa é sabida: ela mi oiou, e começou a matá ele di vagá, rasgano prêmero a barriga
dele... Canaia, disgramado!” (MINAS, 1934a, p. 52).
Apesar dos procedimentos cômicos semelhantes, os comentários acima e o
desfecho são inéditos nas obras sertanistas do autor. Primeiro, o narrador João de Minas
se representa como alguém distante da ordem política interiorana, capaz inclusive de se
indignar e prender um coronel pelos seus atos ilegais e cruéis, pois os valores do
narrador conflitam com o mandonismo dos chefes locais e estaduais. Busca-se uma
coerência entre a lei ou o projeto de nação e a realidade política, que nessas regiões é
inexistente, o que mostra que, entre o livro Jantando um Defunto e Pelas Terras
Perdidas incorporou-se, nas obras de João de Minas, uma visão de setores intelectuais
dos grandes centros urbanos. A retórica que iguala os potentados aos bandidos pela
exploração do povo era próxima das denúncias da esquerda ao coronelismo. Segundo,
não perspectiva de fim da violência, mas apenas da substituição de chefes no poder,
um em nome do legalismo de Artur Bernardes, o outro em nome dos revolucionários. A
morte do coronel é símbolo da manutenção da lei marcial, pois a Mimosa agora é
aplicada ao desafeto do poder vigente. Terceiro, curiosamente é Prestes quem cumpre o
papel justiceiro intencionado pelo narrador. Ao contrário de Jantando um Defunto, aqui
não são apresentados como terroristas e saqueadores. Tomaram calmamente o povoado
e deixaram os adversários depois do pedido de um simpatizante.
O uso do cômico e da paródia nos livros dos anos 1920 nunca chegou perto dessa
virulência contra o sistema político, mas se destinava a atacar os inimigos ou satirizar os
costumes e tabus como o adultério, o flerte, a ganância etc. A mudança no valor
atribuído aos coronéis e a Prestes deve muito à época em que o texto foi publicado, no
rastro de um debate sobre os rumos do país após a “Revolução”. Como outras mudanças,
ela é pontual e efêmera. Mudanças mais significativas na produção do escritor são duas.
Os grupos passam a ser permeados por conflitos internos e discordâncias sobre ideias e
práticas: entre os legalistas a oposição é feita entre o narrador-personagem João de
Minas e o chefe caiadista. Logo, o conflito cotidiano se torna central nas narrativas.
Também há o jogo entre aparência e essência, especificamente o uso cínico de valores
para autopromoção, bem como seu descarte conforme as conveniências. Como veremos
abaixo, em outros textos essas mudanças terão endereço certo, o governo Vargas.
Agruras femininas na passagem para a Segunda República
Este padrão moral das personagens ficcionais foi usado em outro gênero no qual
o autor João de Minas também atuou em 1934, o romance sexual, uma paródia dos
romances sentimentais de enorme sucesso na década. Com elementos estruturantes
comuns, A Mulher Carioca aos 22 Anos, A Datilógrafa Loura e Uma Mulher... Mulher!
constroem a ideia de um mundo torpe, onde imperam egoísmo e hipocrisia pois todos os
valores morais ou solidários são meros simulacros e moeda de troca. Raras as exceções,
todos ao redor da protagonista são corruptos e/ou tarados que se valem das aparências
socialmente valorizadas para enganar o público e se autopromover. A protagonista
romântica é sempre muito bonita, oriunda de uma família nova rica, com posses obtidas
através de práticas socialmente condenáveis: nos dois primeiros romances, o pai
ascendeu socialmente através das negociatas, e no último a mãe conseguiu posses pela
prostituição. Em todos os casos, a principal figura de autoridade da sua família pretende
casar a filha segundo interesses, tentativa recusada pela jovem sonhadora. Geralmente
essa figura de autoridade morre no início ou no meio do romance, deixando a
personagem principal livre para se casar por amor. Porém os relacionamentos não levam
a finais felizes. Como seus amantes terminam mortos ou em altos postos da corrupta
política nacional, todas as protagonistas sucumbem às sucessões de desgraças do
mundo. O ideal de casamento pela consumação apaixonada de amor feliz não se realiza.
As variações nos enredos, narrados em terceira pessoa onisciente, ocorrem por
conta da moda literária, explicitamente referidas pelo autor. A Mulher Carioca aos 22
Anos e Uma Mulher... Mulher! constroem seus enredos numa sátira aos costumes
sociais, o primeiro focando os vícios morais e sexuais de uma camada de ricos e
arrivistas, à moda dos romances dos anos 20 de Benjamin Costallat, e o segundo a partir
dos dramas amorosos de jovens mulheres, à moda dos romances sentimentais para
moças, aliada à torrente de livros sobre o conflito Constitucionalista de 1932. A
Datilógrafa Loura carrega no tom de denúncia próprio dos romances proletários,
fazendo com que a linguagem sexualizante e o foco nos costumes diminuam, com a
maior parte do cômico repousando na crueza e cinismo como que descreve as situações
de espoliação de classe. Além de atuar os gêneros da moda, a composição dos romances
acompanha as mudanças de estadia do escritor Ariosto Palombo, de Uberaba para o Rio,
depois para o interior paulista e, por fim, para a cidade de São Paulo. Por fim, como
forma de captar a atenção do público, referem-se a importantes eventos políticos
recentes, a mudança de regime político em 1930, o conflito constitucionalista de 1932 e a
promulgação da Constituinte em 1933. Uma observação do prefácio de A Mulher Carioca
aos 22 Anos pode ser generalizada para toda a obra do autor mineiro publicada em 1934.
Ao anunciar a matéria, informa que o livro
é uma ponte entre a república velha e a nova. Nesse sentido, é o único. Esse
romance romanceia, mudando os nomes dos bois, os últimos tempos da
república do PRP. E passa para os primeiros tempos da república nova, ao redor
de um moço que acaba interventor de alagoas. O leitor, que ler este livro com a
competente malícia, compreenderá logo o movimento das máscaras. E decifrará
os heróis e a heroína. Porque eles estão vivos, por aí... (MINAS, 1999, p. 11).
Isso porque, nos romances, o sobe e desce de pessoas e grupos políticos no poder
a partir do movimento de 1930 repercutiu no destino de gente comum. A construção
narrativa tende a enfatizar e mesmo dramatizar o papel que esses eventos tiveram para a
história do país ao associá-los com mudanças no destino individual das personagens,
afetadas de maneira drástica, para o bem ou para o mal. Paralelo a isso, o autor reforça
satiricamente a perspectiva de que a corrupção e a hipocrisia perduram em toda a
sociedade brasileira entre as duas épocas, a República Velha e a Nova.
O primeiro romance em que a passagem aparece é justamente A Mulher Carioca
aos 22 Anos. Ambientado no Rio de Janeiro, conta a história de Angélica e de seu pai, o
comendador Anfrísio, que enriqueceu ilicitamente, mas no casamento foi traído pela
mulher e pelo sócio, e morre de desgosto após ser chantageado pelo jornalista Eusébio,
que ameaçava publicar cartas obscenas entre os amantes. Angélica, antes e depois de
herdar a fortuna do pai, é assediada por várias pessoas, inclusive mulheres e o jornalista
que chantageava seu pai, tendo assassinado-o para defender sua honra. Absolvida em
julgamento, Angélica apaixona-se pelo advogado Asdrúbal, que é amante de uma
conterrânea que se transformou em “dançarina egípcia” de renome internacional.
Visando seu dinheiro, o jovem advogado o golpe do baú na ingênua protagonista, que
morre na miséria após o falecimento do filho do casal.
Depois de o autor João de Minas apresentar, através desse fio de enredo, uma
série de negociatas econômicas e taras sexuais, encobertas pela mais escancarada
hipocrisia moralista, o último capítulo do romance termina justamente com a mudança de
regime, no qual o moço golpista se tornou interventor de Alagoas: “Asdrúbal, era
inegável, entrava para a luminosa galeria dos estadistas, proprietários abastados de
gordo patriotismo. É que, enquanto ele saboreava Paris, o sr. Washington Luís foi jogado
na lata do lixo, e rompeu a Segunda República” (MINAS, 1999, p. 208). Asdrúbal, em Paris,
foi requisitado por Getúlio Vargas para ocupar o cargo de Interventor. No encerramento
do romance, o autor passa a narrativa sobre a trajetória de Asdrúbal para a imprensa,
emulando uma notícia de jornal. Tendo em vista o que se passara em todo o romance, a
forma grandiloquente do noticiário tem uma função irônica e, por isso, satiriza a
imprensa ao sugerir que ela é venal, sensacionalista e corrupta:
O caso alagoano acaba de ser resolvido de maneira mais popular e democrática
possível, sendo nomeado para ali um chefe que é, sem favor, um varão de
Plutarco. Um Insigne! Um Incomparável! Referimo-nos, com o devido respeito, e
uma emoção que nos faz tremer a pena, ao probo Dr. Asdrúbal Melanio, excelso
alagoano, aparentado pelo casamento em segundas núpcias coma realeza
egípcia. Esse exemplo de virtudes foi chamado urgente de Paris, onde se achava
em delicada missão confidencial da Ditadura, e é esperado amanhã em Santos
por seus inúmeros amigos. (MINAS, 1999, p. 209-210).
De maneira mais intensa, no romance seguinte, A Datilógrafa Loira, as
personagens foram afetadas pelos eventos políticos de outubro de 30. Este livro conta a
história, os sonhos e as dificuldades da datilógrafa Altamira, que sustenta a família (mãe,
irmão e tia) com seu mísero salário, além de ser assediada pelo chefe Alfeno e seduzida
por Arlindo, dono de uma garçonière voltada a promover prostitutas de luxo. As
inúmeras dificuldades que Altamira padece na capital paulistana, como a prisão de seu
irmão, a doença de sua mãe e o abandono por seu amado Jonas, levam-na a se tornar
prostituta de luxo a serviço da cafetina Alina, cujos clientes eram os grupos dirigentes do
Estado: “Mulher que eu lance, minha filha, está feita. A Chapa Única e São Paulo Unido
tomam logo conta dela...” (MINAS, 1934b, p. 160). O ponto de inflexão para o início das
desgraças é justamente a sucessão de eventos que afetam a família da linda protagonista,
fazendeiros falidos pela crise de 29, sem encontrar amparo entre os antigos amigos
políticos:
em fins de 1932, d. Carmela, viúva, pobre, vinha para São Paulo com os dois
filhos, à procura de velhas amizades, dos antigos políticos esbodegados pela
Revolução, e que a haviam de ajudar numas demandas e ferozes hipotecas. O
major Piraí [pai de Altamira] quebrara, focinhara, num assalto de desgraças
sanguinárias. Perdera tudo. E rebentara, de uma apoplexia, ao ser caçado como
um porco caetetú, nas matas, pela soldadesca revolucionária, com sede nele.
(MINAS, 1934b, p. 18).
A personagem que mais se beneficiou com a situação foi Jonas, pretendente de
Altamira
Quando fui expulso da fazenda, o delegado logo me prendeu, como ‘comunista
inveterado’, a pedido de seu pai. Eu ia ser deportado para Mato Grosso. (...) Um
dia, o delegado recebeu da capital uma carta de um amigo, e passa para o
Partido Democrático. Coisas da politicalha... nesse caso eu não fui deportado
como um indesejável, e pelo contrário para aqui vim com uma boa
recomendação para assentar praça na Força Pública, como elemento secreto do
novo partido, que ia minando o PRP (...) Hoje sou 1o tenente, e me matriculei no
Rio no curso jurídico. Vou vivendo... mas tenho mudado muito. Acho que o país
vai mal, cada vez pior, e precisa de nós, com um balde de creolina na mão, para
lavar os políticos, para desinfetá-los. Eu... (MINAS, 1934b, p. 96-97).
A mesma forma de apresentar mudanças ocasionadas pelos acontecimentos
políticos na vida das personagens também alcançou 1932. No romance tratado, Jonas
também era um aviador famoso que lutou contra São Paulo:
Sou um aviador como outro qualquer. Quando rebentou a guerra de S. Paulo, eu
era estudante de aviação. Não concordei... Fugi para o Rio, num avião de caça.
Fui obrigado a dançar, porque eu não conhecia o motor... Foi duro. Mas hoje
não. Esse avião fez toda a campanha, em todas as frentes, e eu e ele vimos o
diabo! Agora, andamos a passeio. (MINAS, 1934b, p. 96-97).
O capitalista Alfeno politicamente se contrapunha a Jonas, fazendo elogios a São
Paulo nos combates de 1932. Dizia que lutou pela força pública, o que era desmentido por
Altamira: “seu Alfeno não tem cicatriz nenhuma. Ele não pegou sequer num canivete
para defender São Paulo. Ele ficou no seu escritório, despachando fornecimentos, por
ótimos preços, que o general Ataliba Leonel lhe arranjou...” (MINAS, 1934b, p. 103).
Quando a luta terminou, Alfeno também lucrou, mas às custas dos soldados, como disse
uma mãe:
o seu dr. [Alfeno] disse que meu pobre filho, agora aleijado, inutilizado pelo bem
de S. Paulo como o sr. disse ainda há pouco não receberia aqueles 940$000
de soldo atrasado. Foi por isso que ele, à míngua de remédios, lhe cedeu o
direito a esse pagamento por 50$000. Era para uns emplastos, o remédio. (...)
Conversei com meu filho, que ganhou na guerra uma porção de medalhas e
cruzinhas de latão... mas que está na cama, sem um vintém. Estamos passando
fome, seu dr.! O Jonas [filho desta mulher, não o aviador] perdeu até o emprego,
na General Eletrique. E vim cá, para ver se o seu dr. tem piedade de nós, e quer
partir com meu filho o lucro quido do que o sr. recebeu dele. (MINAS, 1934b, p.
62-63).
“Tudo pelo bem de S. Paulo”, repetem como um mantra as personagens de João de
Minas, almejando possibilidades de enriquecimento e sucesso político pessoal. A ironia e
o cômico se tornam mais ácidos ao considerarmos a história da formação da identidade
paulistana. Em fins do século XIX, as camadas letradas paulistanas passaram a forjar
uma imagem de si e de seus antepassados calcada em sua singularidade em relação ao
resto do Brasil. O desenvolvimento econômico oriundo dos cafezais do interior e
posteriormente da urbanização da capital, associada ao progresso, possibilitou aos
intelectuais forjarem uma identidade que recuperava uma concepção positiva do
bandeirante, visto como desbravador, responsável pela feição territorial moderna do
país. O paulista moderno foi associado ao seu antepassado bandeirante, espelho de uma
suposta ânsia por liberdade que legitimou as lutas por autonomia dos republicanos
paulistas no período monárquico, a defesa de sua política federativa com a proclamação
da República, o papel de S. Paulo na nacionalidade após a campanha civilista. O vínculo
simbólico entre bandeirante e o paulista do século XX, primeiramente elaborado no
interior do Instituto Histórico e Geográfico de São Paulo, ganhou o espaço blico com
as políticas de culto ao passado paulista levadas a cabo por Washington Luís na segunda
metade dos anos 10 e na década de 20, intensificado pela vaga nacionalista do pós-
Primeira Guerra. Nessa década, diversos setores da intelectualidade paulistana
debateram sobre qual era o modelo de paulistanidade, alçado a modelo de brasilidade,
mas tomando a existência dessa identidade como algo fixo uma segunda natureza. O
ser paulista justificava as mais diferentes posições políticas e ideológicas, assim como as
alianças, como a que aglutinou os diferentes setores da elite paulista contra o governo
central no movimento de 1932 (Sobre a identidade paulistana, ver FERRETI, 2004;
FERREIRA, 2002; SALIBA, 2004, pp. 555-587; SEVCENKO, 1992; COHEN, 1997).
Todavia, não poucos autores percebiam os limites e as falácias do discurso
pautado no bandeirismo, dentre os quais estavam diversos humoristas que viveram e
escreveram em São Paulo nas três primeiras décadas do século XX. Recuperavam uma
visão noturna da cidade e da identidade paulista, desconstruindo e relativizando aqueles
elementos que o discurso oficial tornava natural o paulista e o progresso , motivo
pelo qual foram quase sempre esquecidos, mal vistos pelos contemporâneos por causa
de sua impertinência, captando a impossibilidade de retratar a São Paulo daqueles
tempos com categorias sociais e linguísticas fixas, “porque o remexer e o escavar da
história e busca da identidade paulista passava também pela paródia e pelo humor, com
sua lógica extravagante e reticente” (SALIBA, 2004, p. 582; SALIBA, 2002). O autor João
de Minas, em seus romances lançados em 1934, parece vinculado a essa tradição
humorística que desconstrói a identidade paulista, mobilizando o mico quando
irrompem eventos que alteram a dinâmica da política. O autor ironizava o progresso de
São Paulo e a figura do paulista, pois o “mundo das aparências sociais e utilização
interesseira dos valores também permeia seus romances no âmbito das identidades
regionais ou nacional. Alfeno é o exemplo mais bem formulado. Num diálogo com
Altamira, diz:
Sou, como a senhora sabe, paulista e civil. Tudo tenho feito pelo bem de São
Paulo. Fui até vereador municipal, no tempo do nosso Paulino Molinaro. Isso
não quer dizer que eu também não tenha em Outubro de 1930 posto o meu tijolo
no edifício da Revolução. Mas fui iludido, na minha santa ingenuidade. E logo na
Revolução Constitucionalista fiz força... fiz uma bruta força contra o Getúlio,
aliás meu íntimo, meu amigo de infância... (MINAS, 1934b, p. 83).
Esse discurso não convencia Altamira. Mais adiante, a datilógrafa loura, em
momento de ser assediada pelo patrão bêbado, escuta:
Minha vida é um romance, Altamira. Vou lhe contar um segredo... Eu não sou
paulista nada! Sou mineiro, de Barbacena. Mineiro velho de guerra! Ali no duro!
Mas minto que sou paulista, para tapear...(...) Ah, ah! (...) Mas os mineiros são os
donos do melhor bocado, o bocado do leão. Somos águias manhosos, arteiros.
Pegamos no cabo do chicote. Você o viu o que os mineiros fizeram na guerra
constitucionalista? O Olegário Maciel, aquela besta velha, aliou-se a S. Paulo.
Depois empurrou-o no buraco, e ficou em cima, rindo... Canalha! (MINAS, 1934b,
p. 138-139).
Assim, a identidade é mera conveniência utilizada para atingir os fins egoístas e
imediatistas das personagens. Esse tema também aparece no terceiro romance do ano,
Uma Mulher... Mulher! Ambientado em Araraquara e São Paulo, é protagonizado por
Luciana que começa o romance fugindo com sua paixão, Abelardo, que apenas queria
prostituí-la e, sem conseguir os objetivos, abandonou-a. Voltando com a fama de
perdida, instigada a seguir o meretrício (profissão da mãe), é salva do ostracismo social
pelo milionário e de família tradicional Setúbal, com quem se casa. Sua obsessão por
homens de olhos verdes, os olhos de sua primeira paixão, leva Luciana a se apaixonar e
se tornar amante de Felipe, filho do marido, até que o mesmo morre no conflito paulista
de 1932. E neste ponto do romance que a transmutação das identidades começa a operar
na narrativa. Setúbal, querendo promover Felipe na política, lhe diz:
eu estava para te dizer. Os chefes do nosso P.R.P. têm me assuntado a seu
respeito. Precisamos de um candidato nosso, adorado pelo povo, para a
Constituinte. O Getúlio prometeu a Constituinte, marcou a data... E você é o
homem do nosso distrito. (...) E você... meu... (...) meu caro afilhado... será eleito
fatalmente, para a glória do nosso Estado... Você é carioca. Mas para mim... você
é paulista. Tudo pelo bem de S. Paulo, meu... afilhado! (MINAS, 1934c, p. 147).
E o médico Felipe, preocupado com o embate de 1932, ao contrário de Alfeno,
pareceu incorporar a nova identidade, ao dizer ao pai: “nós temos nós mesmos, os
paulistas, e basta. Eu não sei porque: mas parece que nasci de novo; quero brigar por S.
Paulo!” (MINAS, 1934c, p. 147). Noutro momento, o autor João de Minas utiliza-se da
paixão de Luciana por Felipe para contrapor suas ideias acerca do debate sobre a
Constituinte, pois Setúbal queria transformar seu afilhado em deputado, o que
aterrorizava sua mulher Luciana, que “era a favor da Ditadura, mas só para convencer o
amante a não ser constitucionalista, e não se meter em embrulhos” (MINAS, 1934c, p.
189). A moça, movida por esse sentimento, passa a refletir sobre a ida ao Rio de Filipe,
onde encontraria mulheres bonitas. Então “Ia protestar, achando que o dr. Felipe não
devia se meter na política. Ademais, a Constituição não viria... O Getúlio, com os
tenentes, não queria leis. Eles queriam era a Ditadura perpétua... Não que eles eram
trouxas!” (MINAS, 1934c, p. 149). Mais adiante, numa conversa entre Setúbal e Felipe
sobre o momento político, quando o médico se dispõe, paulistanizado, a “brigar por S.
Paulo”, Luciana esbraveja:
Você não tem medo de uma violência?... A Ditadura pode instaurar a pena de
morte. É melhor deixar de tolices, essas infames conspiraçõesinhas. Eu sou
ditadurista... S. Paulo precisa de paz, de trabalho. Isso é que é patriotismo. Esses
politiqueiros descarados, como seu Morato, esse traidor Pedro de Toledo, o seu
Sílvio de Campos, Ataliba e outros vagabundos, que roubaram à beça na
República Velha, não hão de arrancar os nossos... os nossos... digamos os
nossos filhos, dos nossos braços, para servir aos seus miseráveis estômagos.
(...) Sou! Sou! sou contra essa... guerra de S. Paulo! Não, guerra de alguns
cavadores, que querem instalar no poder o Julinho, o Barbado, e se encherem
mais ainda do suor amoedado do povo. Malditos! Bandidos!!!! (MINAS, 1934c, p.
171).
Assim, no meio das comemorações e do luto pelo conflito, os constitucionalistas
não estão imunes à sátira do autor João de Minas; por meio do discurso da personagem
Luciana, por interesse em sua paixão, se volta contra as aspirações políticas paulistas.
Em Uma Mulher... Mulher!, a mobilização Constitucionalista de 1932 é mais fortemente
parte da estrutura da narrativa que qualquer outro livro, impactando bastante a vida das
personagens. Isto ocorre, todavia, sem se forjar um sentido positivo para o patriotismo
paulista e para a mobilização de julho de 32. Por exemplo, o sentimento de Felipe por São
Paulo se inflamara tanto que
doou a herança de sua mãe, as 8.000 libras, ao MMDC de São Paulo, num gesto
que os jornais matracaram, assombrados de tanto civismo. Ganhou logo o posto
de coronel honorário do Exército Constitucionalista. Mas ele jogou essa patente
na lata do lixo, insultado com o caráter de traficância que deram à patente.
Escreveu ao general Klinger um bilhete áspero, dizendo-lhe que ‘as patentes
se ganham nas batalhas’. Um puxão de orelha nos fabricantes de oficiais em
série! E alistou-se como soldado raso, no Regimento 9 de Julho. dez dias
partira para as trincheiras. Setúbal, dois dias depois, também como soldado raso
(dessa vez a lata do lixo recebeu uma patente de capitão), correu atrás do filho,
e nada pode impedi-lo de o fazer. Como se vê, tudo se atrapalhara, com o diabo
da guerra santa... (MINAS, 1934c, p. 184-185).
Assim, os combates de 32 levam a um desfecho negativo para aquelas
personagens que se apegam a valores patrióticos. Felipe morrera em batalha, assim
como Ana Petrina, prima de Setúbal, comunista que lutara a favor do governo federal, foi
deportada para Matogrosso. O sentido patriótico desses desfechos é esvaziado na visão
de Margarida, amiga de Luciana, a única personagem bem-sucedida. Prostituída depois
de um escândalo social, no Rio de Janeiro ligou-se ao Piloto do Crato, um soldado que
viera do norte com a Revolução de 30 para depor Washington Luís, e se apaixonou pela
prostituta Margarida. Ao soldado, “a Ditadura, em recompensa dos seus serviços
políticos, dera-lhe uma comissão na Europa, a compra de armas para matar paulistas. E
dinheiro a rodo” (MINAS, 1934c, p. 183). No final da história, quando os combates de 32
terminaram, o comprador de armas foi recompensado. Enfatizando o caráter tirânico do
governante, disse a um colega:
E eu fui ao Getúlio. Falamos uma hora. Depois, ele me deu um charuto, e me
disse: ‘você, seu marreco, é dos nossos! Vou te fazer deputado à Constituinte.
As armas que você nos mandou de Paris derrotaram São Paulo, e salvaram o
Brasil... Você tem que ir para a Constituinte! queira ou não queira...’ (...) Eu....
baixei a cabeça. O diabo do Getúlio é o ditador, e manda à beça. Ele impôs
tiranicamente que eu seja deputado à Constituinte, por Sergipe. Obedeço,
cumpro ordens, como bom brasileiro. A tanto me obriga o espírito
revolucionário. Aceito, vergado e cabisbaixo, mais este posto de sacrifícios.
(MINAS, 1934c, p. 196-197).
Assim, no contexto do romance, se tornam lúcidas as palavras de Margarida a
Luciana:
E, ouça esta! estamos aqui comprando armas para o Getúlio, para a Ditadura,
canhões à beça, mas principalmente espingardas pica-pau para caçar tico-ticos
constitucionalistas, essa gente doida do nosso Estado que quer cuspir no prato
revolucionário... Enfim, estamos no nosso papel de bons brasileiros. E palpita-
me o coração que você também é da Ditadura, avec o seu bom senso... Voilá!
mas (que ninguém nos ouça), se você não for, não faz mal, que eu sou de todos,
e quero hoje é o cobre. Eles são todos iguais, e querem é o tesouro, é os cargos,
o saco da nota... (MINAS, 1934c, p. 181-182).
Percebemos como o autor configurou um mundo no qual ideais transcendentes se
prestam a usos mesquinhos, permeando eventos políticos que afetam os destinos das
personagens. Margarida explicitou o ponto central: os políticos, defendam o PRP ou
Getúlio, a Ditadura ou a Constituição, utilizam-se de ideais patrióticos para conseguirem
dinheiro e poder, mobilizando pessoas que a eles aderem para lutar em prol de suas
causas, morrendo por um sentido vazio, por uma ideologia cujo fundo real é o interesse
de certos grupos. Por isso, Margarida começa o trecho acima com uma defesa da
Ditadura, mas que descamba, na intimidade, para a vontade de possuir “o cobre”. Talvez
por tamanha iconoclastia esse livro não tenha permanecido na memória e na bibliografia
sobre a luta de 1932.
A reflexão sobre o sentido dessa dinâmica de poder foi empreendida pelo autor
nos livros ficcionais. A roda da história política brasileira, em A Datilógrafa Loura,
parece na iminência de girar novamente, com a mudança de poder através de “métodos
revolucionários”, isto é, golpe militar. Jonas parece encarnar os prognósticos de uma
nova revolução, inclusive com a mesma imagem do terremoto usada pelo escritor
Ariosto Palombo na crônica Depois, Miseravelmente depois. O autor João de Minas faz o
aviador conversar com Altamira nos seguintes termos:
(...) Porque eu não te via, desde que sumi da fazenda. E eu não sabia de nada,
Altamira.
Também como que houve um terremoto sobre o Brasil.
Sim, sim, sobre. Depois virá o terremoto sob, por baixo do Brasil...
Chi! Mais Revolução?...
Qual revolução nada! espumou Alfeno. Mas ninguém o ouviu. (MINAS, 1934b,
p. 107-108).
Essas palavras ficarão gravadas na mente de Altamira. Quando, após um mal-
entendido, ao ser abandonada por seu amor, que viajou para a França, a datilógrafa teve
um sonho ou visão antes de se tornar meretriz:
Jonas a olhava, dizia-lhe:
- Eu não fui à França estudar aviação coisa nenhuma. O Espírito Santo Cardoso,
o João Alberto, o Goes Monteiro, o Juarez, o Pedro Ernesto... esse pessoal de
tutano me mandaram foi comprar armas. Armas, que é o espírito revolucionário!
Para a Revolução, a verdadeira, sob o Brasil, por debaixo, nos alicerces!...
E Jonas ria, vitorioso, todo alastrado de bordados e galões. (...) Altamira olhou
bem, viu. O tenente Jonas era agora generalíssimo de mais duas batalhas de
Itararé. Era também o barão de Itararé. Estava no Catete, sentado no palco
supremo. Era o terceiro ou quarto Ditador! (MINAS, 1934b, p. 162-163, grifo do
autor).
Dessa forma, o autor João de Minas valeu-se de uma fórmula narrativa em torno
da qual elaborou seus romances sexuais desse ano, misturando os dramas amorosos de
suas belas protagonistas com uma sátira política e social, e referências explícitas aos
episódios políticos recentes do país, que afetaram a vida das personagens. A visão
cômica do presente, além de dar atualidade à sua obra para cativar as graças do leitor
médio através dos escândalos, tomava como alvo satírico o novo poder e a sociedade que
tais poderes pretendiam exprimir.
Desfazendo a segunda ilusão republicana
Um ponto notável do cômico na ficção do autor João de Minas relaciona-se com
formas. O escritor Ariosto Palombo manifestou a intenção de fundar o romance popular
brasileiro, atingir um público mais amplo que os intelectuais. Por isso os romances de
1934 visavam explorar os temas palpitantes e gêneros mais vendidos dos anos 1930, o
sertanista (aventuras), sentimental (um deles romance proletário) e até o policial. Porém,
os lances cômicos minaram os preceitos reconfortantes dos gêneros populares da
década. No caso das obras sertanistas, o cômico aparece apenas em uma de suas partes,
resguardando-se núcleos de aventuras e viagens pelo sertão. Nas obras urbanas a
distância dos preceitos dos gêneros é mais evidente, seja a não concretização do amor
romântico e seu rebaixamento para o sexo nos livros sentimentais, ou o não
direcionamento das energias de indignação contra o capitalismo no romance proletário.
A sátira cômica contra a sociedade que permeia tais obras lhes conferiu uma
característica de inversão paródica.
Se olharmos mais de perto os conteúdos das representações, percebemos que, ao
lado de uma autopromoção pelo sensacionalismo e escândalo (principalmente sexual),
nas obras do autor João de Minas ênfase na permanência das práticas políticas e
sociais que tanto eram apontadas nas oligarquias da República Velha pelos novos donos
do poder, os quais insistiam nas rupturas revolucionárias em nome e em prol do povo.
Sua literatura e visão do estado de coisas do período 1930-1933 estava afinada com as
posições políticas dos perrepistas paulistas: a ausência de ruptura na prática política
antes e depois de 30, o espaço do poder como politicalha voltada para interesses
mesquinhos, o estado de instabilidade e caos político gerado por outubro de 30, a
ditadura como ausência de liberdades e o papel mobilizador da imprensa na queda do
governo Washington Luís. Nesse sentido, aparece na obra do autor João de Minas o
ressentimento pessoal destilado por Ariosto Palombo contra o novo regime, também
veiculado por setores da classe política alijada. Todavia, ao contrário da posição do PRP
nesse período, o autor João de Minas não se engajou na defesa paulista pautada nos
mitos bandeirantes e na identidade regional. No bojo das mobilizações concretas e
simbólicas em torno de 1930 e 1932, os romances lançados em 1934 são marcados pela
concepção cética do movimento da História presente da crônica Depois, Miseravelmente
Depois...: apresentam uma Ditadura, enfatizando a concentração por Getúlio Vargas,
numa situação arbitrária de mando e desmando que o cronista Ariosto Palombo também
percebia como instável. Sem expectativas positivas com o novo regime, a única mudança
vislumbrada no horizonte futuro era a sucessão de deposições pelo controle do Estado
por golpes “revolucionários”. Tal projeção ficcional do autor João de Minas, análoga à de
Ariosto Palombo e também outros contemporâneos, se mostrou acertada; só não
contaram que esse golpe seria dado, em 1937, em prol da manutenção abertamente
ditatorial do próprio Vargas.
Quando analisamos o mundo ficcional, notamos um passo além da linha cética em
relação aos discursos salvacionistas da época. O autor João de Minas leva o ceticismo de
Ariosto Palombo na direção de uma iconoclastia, efetivada através da representação
satírica de toda sociedade e dos acontecimentos recentes do país, especialmente de São
Paulo. De maneira cômica, através do jogo entre aparência e essência, constrói um
universo regido pela busca, pelos grupos de poderosos e arrivistas da vez, de poder e
dinheiro por meio da corrupção generalizada. A maior parte das personagens como
Alfeno e Asdrúbal defendem seus próprios interesses econômicos e políticos, além de
buscar a liberação pervertida e não amorosa das taras sexuais. Para isso, hipocritamente
encobrem seus vícios e exploram as ilusórias crenças e valores alheios, como o
patriotismo paulista, utilizados cinicamente para angariar adesão social, dinheiro, poder
e prestígio. Em enredos nada confortadores, tudo isso é contrastado com as trajetórias
das protagonistas como Angélica, Luciana e Altamira, as lindas moças apegadas a valores
românticos, pelos quais se tornam igualmente deslocadas do contexto social corrupto.
Raras as exceções, quem se apega a qualquer valor não egoísta ou não participa da
bandalheira geral costuma sofrer o peso de suas escolhas e sucumbir física, mental ou
moralmente à ordem do mundo. Em suas obras ficcionais, o autor igualou os grupos
dirigentes de São Paulo, as elites políticas, econômicas e sociais, a seus adversários na
busca corrupta pelo poder, dinheiro e taras sexuais. Porém, tais valores não são apenas
das elites; com algumas exceções como as protagonistas, se espraiam por todas as
classes, cujos membros esperam oportunidade de explorar os outros, enriquecer e
ascender socialmente.
A tira cômica de João de Minas leva a um beco sem saída. Lembremos que o
escritor prometeu um mundo novo à mocidade, a audiência à qual se dirige e cujos
valores e aspirações espera compartilhar. Porém, nos enredos de suas histórias, não
apenas os valores românticos, mas de qualquer natureza, são objeto de ridículo ou, pior,
mobilizados por interesses mesquinhos de todos os personagens espertos,
independentemente do grupo político ou de classe. Toda a sociedade brasileira, da Velha
e da Nova República, é atacada exageradamente como corrupta, hipócrita e tarada, mas
os poucos que se salvam não conseguem viver segundo outra moral, valores e práticas,
restando a eles abrir mão dos valores ou da vida. Assim, o esforço iconoclasta busca
representar a continuidade do passado no presente, apontando a necessidade de
mudanças e vislumbrando um futuro diferente. Porém, tal como configurada na ficção, é
um futuro quase impossível de alcançar, restando a triste reprodução indefinida do
presente indesejado. Ao enfatizar as mazelas da modernidade à brasileira, o autor João
de Minas aos textos uma nota crítica não programática, e se afina às perspectivas
humorísticas gestadas durante a “primeira desilusão republicana” na última cada do
XIX. Passando pela Belle Époque e pelos anos 1920, esta corrente chegava aos anos 1930
representada na pena de, entre outros, JBananére e Aparício Torelli (SALIBA, 2002,
cap. 4), que também não cessaram de apontar comicamente as agruras, continuidades e
brechas da autoproclamada Nova República. A sátira cômica do autor João de Minas é
uma arma com bala de festim, apontada e atirada contra alvos que, mesmo atingidos, o
autor considera incapaz de abater ou ferir, apenas capaz de mostrar.
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